sábado, 24 de dezembro de 2011

Crepúsculo e Alvorada


...e hoje, como em muitos dias ultimamente, tinha morrido mais um pouco. Não era apenas a dor da derrota. Isso tinha se passado há muitas décadas, mas era uma falha mais pessoal. Interna. Algo que corroia sua alma de maneira tão avassaladora que ele não podia mais se imaginar sem aquela dor. Sem aquele vazio. Melancolia. Seu corpo estava não apenas cansado da demanda dos novos dias, mas de todo aquele sofrimento. De tudo que havia acontecido. Passado. Toda uma complexidade e per causos que os deuses tinham se perdido dele mesmo.
A grama verde se movimentava letargicamente de maneira suave e ordenada tão fluídas que acabava lembrando as ondas de um mar sereno como as águas da Baía de Branchala. O vento podia acariciar livremente o campo naquela altura, pois os olmeiros já estavam mais espaçados e suas nodosas cascas velhas se rendiam ao luar carmesim que davam todo um aspecto onírico para a antiga Floresta Enegrecida. Toda aquela paisagem enrubescida o trazia lembranças dos seus fatídicos dias em batalha. O desespero da guerra. Massacre. Recordou de como tudo ficava tingido do sangue daqueles que morreram por sua causa. Homens que ele matou. Homens que se sacrificaram por ele. Heróis. Lembrou da Batalha nos Campos do Orvalho da Aurora e da vergonhosa forma que tinha sido rechaçado naquele confronto.
Não queria pensar nessas coisas. Aprendera que tinha de enfrentar seus medos, mas já estava exausto daquilo. Um sentimento que o puxava para baixo. Tristeza. Por isso tinha abandonado aquela vida de triunfo e tormento e agora tinha buscado e exílio em um lendário mosteiro que infelizmente ficava tão perto dos lugares que traziam aquelas vis lembranças. Lugares em que viveu sua derradeira carreira como o comandante de suas hostes. Derrota. Era sempre assim quando deixava seus novos irmãos e se aventurava na borda da floresta para encontrar sua paz.
No entanto, mesmo em meio as suas ponderações sobre as erronias ações que tomara. Contemporizando sobre suas falhas. Sobre seu passado. Mesmo assim ele percebeu com certa facilidade que não estava sozinho na floresta. Que havia alguém além dele mesmo e dos animais que habitavam aquele bosque. Uma respiração diferente e ofegante que não fazia questão de se esconder.
O velho guerreiro levantou e se guiou por seus sentidos. Desejou que tivesse com seus antigos batedores, mas agora dependia apenas dele mesmo como ensinara os monges, mas tinha aprendido muitos de seus truques. Demorou, mas achou a origem do som quase fantasmagórico, um ruído sussurrado, mas desesperado de uma pequena garota caída no meio da floresta.
Era uma menina magrinha e frágil de cabelos negros contrastados pelo corpo tão alvo quanto à neve que caia nas cordilheiras mais altas. Não era uma brancura comum dos povos que viviam ali. Os solâmnicos costumavam a terem os cabelos loiros de pele aveludada, mas rosada. Entretanto, não era isso que o homem reparou de imediato, mas no sangue que encharcava as vestimentas simples da moça que estava agarrada a uma espada quase tão longa como ela mesma.
Pegou e jogou a arma para o lado, mas tempo suficiente para perceber que o metal de que era feita seria mais do que mero aço. Deslizou carinhosamente suas mãos pela pequena a fim de encontrar seus ferimentos. Ela não estava ferida exceto pelo interior de suas orelhas. O sangue, nas roupas, provinha de outras pessoas e rapidamente o velho reparou que a espada também estava banhada em rubro seco.
Sua percepção era assombrosa proveniente de todo o tempo que ele fora experimentado em inevitáveis batalhas e conflitos. A guerra tinha afiado seus sentidos e espírito. Apenas por isso tinha encontrado a menina. Apenas assim era possível e aquilo lhe deu uma ligeira sensação de alívio. Era hoje um homem diferente do que fora há tempos e ambos, o que era e o que é, opondo-se em sua alma.

Um clássico confronto entre o antigo e o novo.

Levou-a para debaixo de uma árvore enegrecida e foi à cata de folhas que pudessem usar para fazer lhe uma cama e cobri-la, pois mesmo não machucada a garota estava com certa febre que a deixava cálida ao toque. Delirava sobre perseguidores e as vezes chamava por sua mãe e irmãs. Quando era assim ficava difícil para ele segurar a garota, mesmo miúda como era, pois estava tomada em cólera.
Tinha de fazer uma fogueira, não para aquecer, mas para preparar ervas que ajudariam a diminuir a febre. No entanto, ele também não tinha tais ervas e teria que, ou encontrar algo na floresta, ou levar a pequena rapidamente até o mosteiro de Majere que vivia agora. Felizmente isso também era algo que tinha aprendido com seus antigos batedores, seus rastreadores, e servil bem naquele momento.
Encontrou a planta que, embora seu povo a chamasse de Folharmarga, também a conhecia pelo nome élfico de Anvualil. Era de folhas pequenas e arredondas que tinha um tom mais claro de verde que qualquer outra erva que conhecia. Crescia próximo das raízes dos Olmeiros quando não eram mortas pelas trepadeiras que também nasciam ao sopé dessas enegrecidas e velhas árvores. Nos Reinos dos Senhores dos Cavalos era usada para ajudar a cicatrização que tinha que ser mascada, daí o nome, e depois colocada nos ferimentos, mas os antigos povos das florestas sabiam usá-la de outra forma. Fervendo em uma espécie de chá para ser tomada e atenuar tanto a febre como dores de cabeça. Não era o único conhecimento que o experimentado comandante tinha dos elfos ou de qualquer outro povo do vasto continente de Ansalon.
Fez uma infusão com as ervas que tinha e os olhos da jovem abriram com o crepúsculo daquele dia. Olhos profundos e escuros como a noite que vinha, mas sua íris tinha pequenos riscos claros que refletiam tanto as estrelas que pareciam ter uma luz própria. Quase que como uma desfeita para o negror tanto da noite como o da alma daquele homem. Havia ainda muita vida naquele franzino como que desafiava a morte com a coragem digna de um Cavaleiro de Solamnia, ou ao menos de como apareciam em suas canções e estórias, rechaçando todo o mal que permeava o mundo.

As trevas que são repelidas pela luz.

Inicialmente a infante assustou com aquele homem próximo a ela, mas não demorou muito a entender que ele estava lá para ajudá-la ou foi o que deve ter pensado no primeiro momento. A cólera ia e vinha e não conseguia pensar direito. Tentava desesperadamente entender o que estava acontecendo, mas conseguia ver pouco, as imagens eram envoltas de brumas e sua visão estava nublada como se tivesse andado dias pelos desertos de Khur.
Entretanto parecia evidente demais que aquele velho era bem mais do que aparentava, mas havia algo nele que transmitia confiança. Algo na serenidade do seu olhar embora houvesse também alguma tristeza nele. Algo na leveza de seu toque embora tivesse as mãos cheias de calos. Algo na extrema atenção que ele cuidava dela embora sempre tivesse olhos atentos ao que acontecia em sua volta.
Não era tão velho assim, afinal. Já tinha algumas entradas nas laterais da tez, mas era quase imperceptível. O que lhe dava mais o aspecto de ancião eram os cabelos cinza e os brancos salpicados na barba cortada rente. Sua pele era morena, também em contrastes aos solâmnicos que viviam naquela região, mas era alto como qualquer Senhor dos Cavalos. Estava vestido com típicos trajes de monge, mas com tecidos resistentes que deveriam vir de Ergoth ou das terras frias do sul. As botas de couro curtido e a espada curta que trazia na cintura denunciavam que ele não era um dos discípulos de Majere... e era incrivelmente taciturno também. Uma expressão dura em contraste a aparência dócil de um velho abade.

A rigidez que se opunha a leveza.

A jovem esforçou-se tanto para ver quem era o velho que acabou desmaiando novamente em meio aos seus devaneios febris. Voltou para as profundezas de sua alma e fora absorta no pesadelo que a perseguiria pelo resto de sua vida. Reviveria para o resto de seus dias o que a levara a estar perdida naquela sombria floresta. O desespero incandescente a visitaria mais uma vez. A morte vermelha que percorria os seus trazendo um medo devastador em suas assas.
Assim a garota se lembrou de estar em sua casa, uma pequena casa feita da madeira negra dos olmeiros envernizada com simplicidade. Sonhara com a torta da sua mãe que era uma lembrança tão viva que podia quase sentir seu cheiro. Estava alegre aquele dia, pois era seu, até a chegada do caos.
Viu claramente quando os arautos da morte vieram com suas armas cruéis e armaduras escuras. Matando, pilhando e queimando tudo sem ao menos declararem seus motivo. A menina não sabia, mas eles eram os Cavaleiros de Neraka com suas armaduras entalhadas com crânios púrpuras feitos de Thrandiliun, o mesmo metal forjado nos Vulcões do Destino que compunham a espada que a criança trazia. Mais resistente que o aço e mais leve que o ferro.
Estava em pânico quando aqueles homens invadiram tão violentamente sua casa como tomaram sua mãe e irmãs. Quando vieram para a garota com seus sorrisos pretensiosos ela foi cometida por uma cólera de raiva e fúria. Tudo se tornou rubro e a jovem, mesmo no sonho, não conseguia reviver o que aconteceu depois. Quando deu por si estava na casa ainda, mas havia sangue por toda parte. Uma espada estava em suas mãos e os homens mortos empilhavam-se pelo chão da sala.
Mais vozes vinham das ruelas fora da casa e a jovem ainda teve a inteligência de tentar fugir soturna para a floresta, mas não pode alcançar os bosques. Entenda que a moça teve a serenidade de não se abalar com os vizinhos, pessoas que cresceram com ela, serem mortos pelos vis guerreiros em sua volta. Ficou firme mesmo vendo as outras mulheres serem violadas e as crianças chorarem. Não foi isso que quebrou a vontade de sobreviver daquela menina. Quando toda a esperança abandonou-a completamente até no fundo de seu coração. Foi quando o destino se revelou fatal e carmesim.
Um silvo estridente ecoou pelos céus como um aviso da medonha ameaça de poder incomensurável que estava devir. O som era tão ruidoso que seus ouvidos doeram e sangraram como se estivessem sendo perfurados por um punhal afiado de forma tão terrível que nunca cicatrizaria. O medo mais antigo e primitivo vindo do canto mais escuro de sua alma personificou-se em uma besta hedionda para tirar-lhe completamente a razão. A desolação tinha vindo visitar sua vila. O dragão tinha descido como um raio do firmamento.
A criatura vermelha como o sangue fervente sobrevoou o lugar e trouxe consigo seu pavor tirando a sanidade de todos. Alguns choraram por se sentirem totalmente abandonado pelos deuses e outros simplesmente caíram com as mãos aos ouvidos ou no peito. Fulminados pela simples visão da serpente rubra que conheciam apenas pelas lendas em baladas de tragédias.
E a criatura abriu a bocarra. Soprou. Seu hábito incandescente como os vulcões do inferno queimaram as casas e ardiam sobre todo o vilarejo. Podia se sentir o cheiro da madeira, carne e ossos sendo engolido pelo fogo enquanto a criança fugia para a floresta. Nada mais se podia fazer a e garota entregou-se ao total desespero.
A menina acordou pela manhã toda suada e só não berrou porque o medo da besta a deixava paralisada. Nunca esqueceria aquele som ardido, suas assas vermelhas como a morte e sua baforada quente como o próprio sol.
Devia ter muita vontade de viver para ter sobrevivido ao ataque, pois esses cavaleiros eram incrivelmente bem treinados e a fé na sua nefasta causa era inabalável, além de que, muitos, teriam morrido apenas pelo pânico de ver o Dragão, em toda sua magnitude ancestral, mas havia mais naquela garota.
O homem, mesmo sem saber de sua história, podia sentir isso na jovem e percebeu o que tinha de fazer. Não acreditava que tinha a encontrado por acaso e resolveu que treinaria e ensinaria a moça, mesmo não tendo certeza se era a pessoa certa a fazer isso. Estava velho, era verdade, mas sua experiência bastaria e ela era muito nova ainda. Aprenderia rápido a despeito de seu próprio cansaço.

Um decadente e a outra em ascensão.

Aquele homem que a recolhera estava de pé em feições bem menos amigáveis a ela ou ao menos pelo que lembrava em meio aos delírios que teve. Aquele olhar afável transmutou-se tão incrivelmente que nem parecia mais a mesma pessoa. Era outro agora. Ainda mais duro. Tinha uma expressão ferina como um velho leão que tinha de perseguir a própria caça.
- Levanta-te! – invencível, sua voz soou como ordem, talvez como nos tempos em que era um grande comandante – Não temos o dia todo.
- Como assim? – a garota, claro, ainda estava atordoada e levantava com uma letargia que o veterano tomou como indolência – Eu não...
- Se os antigos deuses não estivessem todos perdidos, diria eu que foram eles que fizeram com que nossos caminhos se cruzassem.
- Eles não existem!
- Existem, bem... existiram. No entanto, não vamos perder tempo com o que já foi, pois é o que virá que devemos nos ater.
- Espera...
- Não! Levante e tome aquela arma novamente, como fez antes, sejam quais fossem os vossos motivos. Quero saber do que tu és feita.
Por algum motivo desconhecido, até por ela mesma, a jovem não teve nem um pouco de medo. Talvez por conhecer um pavor maior. Mas a verdade era que confiava estranhamente naquele guerreiro e afinal a tinha acolhido e sanado sua febre. Limitou-se apenas a levantar e pegar a enorme espada que tinha, para sua mente inexperiente, uma leveza quase sobrenatural. No entanto, mal tocou a arma o homem a atacou e com um único golpe com a lâmina de sua curta e facilmente arremessou longe a espada dela.
- Como eu imaginei. – disse severamente o velho – Não passa de uma simplória criança camponesa.
Não foi o “camponesa” e nem o “criança” que a incomodou, isso ela era, mas não gostou do tom de desprezo do homem ao chamá-la de “simplória”. Havia certa relação de poderes entre os dois que a garota não gostava. Ele se portava como superior a ela e pior... a jovem também se sentia inferior. Não gostava disso.
- Pegue a arma novamente e não a deixe cair desta vez. Ela faz parte do teu corpo e possui teu espírito! Tu és a espada e a lâmina és a ti mesma.
- Mas foi você que me tirou...
- Não! – negou com firmeza o comandante – Tu não foste capaz de mantê-la nas próprias mãos e eu apenas ajudei. Vós estais prostrada, minha cara espada, tua por própria incompetência! Não está afiada o suficiente, mas devemos cuidar disso, não é mesmo?
A garota pegou novamente a espada e tentou imitar a posição que o homem estava e ele gostou disso. A menina aprendia rápido e era mais observadora que imaginava, mas não queria que a jovem percebesse seu contentamento. Poderia ficar arrogante, a criança. Assim o velho atacou novamente e desta vez, com um golpe de corpo, derrubou a moça além da arma.
- Você é mais forte que eu. – concluiu ela – Não é tão velho quanto aparenta.
- Então tu adquiriste a incrível habilidade de perceber o óbvio.
Movida pela a raiva a menina pegou rapidamente a espada e investiu com toda sua força contra o homem. Foi um movimento vigoroso que impressionou o antigo comandante. A garota deu alguns passos, saltou erguendo a arma por cima da cabeça e desceu com tudo que tinha.
No último momento o homem esquivou-se para o lado com apenas um passo e assim que a jovem caiu no chão, em pé, ele usou a própria cintura contra as costas dela a fim de derrubá-la e a garota se chocou ruidosamente no chão.
- Sabe por que caíste?
- Eu... – ela contemporizou por um tempo sobre a resposta – Porque eu o ataquei com fúria.
O homem gostou, a garota estava realmente o impressionando.
- Não! – mas respondeu negativamente – Caíste porque não canalizou tua raiva. Tu não deves negar tuas emoções, pois elas são a ti, espada. Ao invés disso, deves controlar tuas emoções e manejá-la como fazes com tua arma.
- Pensei que eu fosse à espada...
- Bom! – ele se afirmou se permitindo sorrir – E como tu és uma espada tuas emoções nunca devem ser percebidas. Aparente se fria como o aço que é gélido embora seja dobrado na ardência das forjas. Assim, não esqueça teus sentimentos, pois eles a definem. Use-os, confie neles e os esconda bem, mas antes vem a lição mais importante... fique de pé.
A jovem se abrumou e novamente imitou a posição do homem. O experiente comandante foi perto dela e a acertou em sua postura.
- A base é tudo, vê? – perguntou retoricamente o homem – Por isso caíste nas outras vezes, percebeste? – o guerreiro experiente voltou-se para sua posição e ficou em base – Deves ter uma boa postura sempre. Ser equilibrada e reta. Isto não apenas na luta, mas na vida. Deves sempre manter uma base sólida. Não a solidez de uma pedra, mas enraizada como esses olmeiros em nossa volta. Faça parte do ambiente... seja... fluída!
- Entendi!
- Sejamos firmes e, apenas deste modo, devemos enfrentar a tormenta com serenidade. Compreender que os cruéis se levantaram contra nós com suas lâminas maliciosas em hostes perversas porque somos aqueles que não se dobram a escuridão. Lutamos por um ideal que entendemos ser justo e defendemos aqueles que não podem fazer o mesmo. Não porque nos acharíamos superiores a eles, mas apenas porque podemos defendê-los. Assim tentamos melhorar um mundo que inexoravelmente se bate contra nós, esperando nunca cair na arrogância de acharmos que somos os verdadeiros arautos da bondade e do que é certo.
Então ambos voltaram ao treinamento, mais equilibrados desta vez. A garota podia não ter os anos de experiência militar e técnica que o velho tinha, mas tinha uma força de vontade inabalável e aprendia tão rápido que já dava orgulho ao experimentado comandante. Ele estava em franca queda de suas habilidades e deprimido enquanto ela era jovial e estava alcançando seu ponto máximo. Um clássico confronto entre o antigo e o novo. As trevas que são repelidas pela luz. A rigidez que se opunha a leveza. Um decadente e a outra em ascensão.

Crepúsculo e Alvorada.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

O que?





O que oculta por trás do seu sorriso?
Existe um significado em seus lábios.
Algo que você grita desesperadoramente.
No entanto, não consigo de decifrar seu enigma.
Uma questão que não me deixa em paz.

O que busca com seu olhar?
Existe alguém que captura em seus olhos.
Algo que quer gravar em ti.
No entanto, não sei se sou eu que persegue.
Uma dúvida que não me permite agir.

O que encanta com seu toque?
Existe um significado em seus movimentos.
Algo que quer trazer para si.
No entanto, não sei se enfeitiçou quem queria.
Uma certeza é que estou caindo...

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Qualquer outra coisa...


“Ela é só uma menina
E eu pagando pelos erros que eu nem sei se cometi
Ela é só uma menina
E eu deixando que ela faça o que bem quiser de mim
Se eu queria enlouquecer essa é a minha chance
É tudo que eu quis”

Romance Ideal – Os Paralamas do Sucesso








Eu não fiz nada, mas você veio até mim mesmo assim. Evitei-te ao máximo, mas devo admitir que não tentei o suficiente. Como eu poderia se já estava perdido desde antes dos seus olhos pararem nos meus. Não podia me defender de sua aproximação e fiz coisas que jamais julgaria capaz de realizar. No entanto, não há um segundo de arrependimento em mim.
Não foi uma chegada rápida ou abrupta. Vindo de mansinho como quem não queria nada e talvez até tenha sido o que aconteceu. Mas foi ficando e se espalhando em todo meu coração como se já fosse dona dele há muito tempo. Era cada vez mais difícil evitar você. Era cada vez mais difícil não pensar em você. Era cada vez mais difícil não te querer perto.
Então nos admiramos. Eu e você. O que havia em volta não importava mais. Na verdade nem mesmo nós dois importava mais. Apenas como um via o outro. Imagens idealizadas de nós mesmos, ou talvez um tenha visto verdadeiramente o outro pela primeira vez. A sintonia era evidente até mesmo para os que não habitavam nosso mundo. Não era amizade nem amor, devia ser qualquer outra coisa.
Assim nossos corações se tocaram. Um momento único que nenhum de nós pode explicar depois, mas apenas sentir. A intensidade ocupou o espaço de toda a calma que havia até então e nenhum dos dois conseguiu entender bem o que aconteceu. O bem querer se tornou palpável com um toque suave, mas que rapidamente se tornou dolorido. Nossas vidas tomaram outro rumo desde então.
Tudo que aconteceu foi fantástico. Mesmo quando não soubemos como reagir devido à vertigem de informações e mudanças que estavam acontecendo em nossas vidas. Segredos não foram revelados apesar de um confiar no outro como nunca fizemos antes. As transformações continuam acontecendo e embora pareça cada vez mais distante agora, ainda não sabemos se teremos um final feliz. Se existe ainda alguma esperança em nós.
O que é fato agora é a distancia. Seja ela provocada ou natural cada vez mais um não se conforta mais no outro. Seja amor ou amizade. Tomamos caminhos tão diferentes que até parece que foi por medo. Insegurança do que poderia ser e de tudo que deveria ser enfrentado. Fomos pelo caminho mais fácil. Eu vou partir, mas não sei se isso é um adeus ou apenas um até logo. A única coisa que tenho certeza é que voltarei para aquela velha casa e a porta estará apenas encostada...

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Questão de Fé...


“Feel the anxiety hold off the fear
some of the doubt in the things you believe
Now that your faith will be put to the test
nothing to do but await what is coming
Why is then God still protecting me
even when I don't deserve it?
Though I am blessed with an inner strenght
some they would call it a penance
Why am I meant to face this alone
asking the question time and again
Praying to God won't keep me alive
Inside my head feel the fear start to rise...”

Sign Of The Cross - Iron Maiden



Caiu de joelhos no campo de batalha com os braços latejantes de dor e com uma leve vertigem por todo o esforço que a guerra lhe trazia aquele dia. Podia sentir o cheiro de morte por toda a parte e se perguntou se haveria perdão para tudo aquilo. Observava o que tinha feito e mais uma vez sua bravata escapou a boca.
- Sou a vontade de Deus e antes de cair verei os corpos dos meus inimigos em minha volta consagrando essa terra com seu sangue infiel!
Olhou para o céu como quem quisesse desviar do resultado do seu próprio pecado. Como se assim o fizesse, teria respostas para tanta brutalidade. Matar era pecado, mas escutou seus padres dizendo que matar um infiel era um passo para o paraíso. No entanto, como então podia se sentir tão mal ainda?
Tinha a impressão que o nível do sangue no chão era tanto que atolava seus joelhos, mas deveria estar delirando. Claro! Estava exausto da contenda e matar os muçulmanos não era assim não fácil como os mais velhos diziam. As canções também não diziam o quanto era bárbara e cruel a guerra. Não falaram do quanto ele se sentiria sujo...
Mesmo o negro de sua roupa estava ruborizado, mas não tão tingindo como a cruz branca que percorria quase toda a vestimenta. Lavaria com dificuldade, mas sairia. Complicado seria tirar o sangue da cota de malha, talvez limpando anel por anel. Mas e a sujeita de seu corpo? Mas e a sujeira de sua alma?
Não! Aquilo era errado e não importavam o que diziam. Passou toda a vida sendo um bom cristão e agora a própria cristandade o tinha enviado para uma terra que só conhecia pelas escrituras e para que? Para matar pessoas estranhas cuja cultura exótica nunca tinha ouvido falar. Não havia sentido naquilo.
Os outros cavaleiros pareciam não se importar. A vontade de Deus. Ouvira muito essas palavras ultimamente, mas não tinha mais tanta certeza disso. Na verdade, não tinha mais certeza do certo ou do errado. Não sabia se o mundo era mesmo era mesmo dividido entre o bem e o mal. Desacreditava nos desígnios de Deus, afinal Ele, em Sua infinita sabedoria, não poderia permitir aquela atrocidade.
Sabia, no fundo, que os homens eram culpados por seus atos. Livre arbítrio. Culpar Deus era apenas uma maneira de se enganar. Ele mesmo era o responsável por todas aquelas mortes que provocara. Pelos órfãos que fizera. Pelos pais que nunca verão seus filhos voltarem. Pelas mulheres que sofreram com lágrimas e lamentos...
Assim só restava uma coisa a fazer. Umas palavras a proferir:
- Requiem aeternam dona eis, Domine, et lux perpetua luceat eis.Te decet hymnus, Deus, in Sion, et tibi reddetur votum in Jerusalem. Exaudi orationem meam, ad te omnis care veniet. Requiem aeternam dona eis, Domine, et lux perpetua luceat eis.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Perto.


“Não quero estar neste lugar e ver você partir
eu quero te esperar aonde você quer ir
te receber
te acomodar
te oferecer a mão
poder cantar, te acompanhar ao violão”
De Perto – Os Paralamas do Sucesso

Olhou pela janela observando o belo jardim que se espalhava na frente de um pequeno quarto na parte velha da cidade. Imaginou se ela passaria por ai e voltou a ver a cama vazia tomando um trago da garrafa de cerveja que tinha nas mãos. Lembrou dos momentos que acabara de ter junto com a mulher que amava e como algo tão lindo podia ter se perdido assim.
Voltou a olhar para fora e viu várias pessoas passando e se perguntou como deveriam ser suas vidas na complexidade e profusão de sentimentos que ele mesmo se via. Ele tinha conhecido muitas mulheres e passado por aquilo várias e várias vezes e então porque era diferente agora? O que tinha mudado?
Não tinha entendido bem o porquê ela o deixou, mas de qualquer forma ele mesmo sabia que as coisas seriam mais serias agora e estava na fase que normalmente a afastaria. Fez isso com todas as mulheres que teve e por algum motivo tinha se sentido muito mal desta vez.
Ele a viu atravessando as ameias floridas da primavera que embelezavam ainda mais o jardim do parque e entendeu que era ela diferente. Que encontrara uma mulher diferente de todas as que passaram por aquele quarto e contemporizou se não havia perdido a mulher de sua vida.
Não!
Estava sendo romântico e isso ele apenas era para conquistar as mulheres. Estava agindo como alguém que não estava no controle. Alguém... apaixonado.
Então ele finalmente entendeu a diferença de seus sentimentos e como aquela mulher era diferente. Ele a viu parar e quase olhar para trás. Quase a chamou aos berros, mas sabia que aquele não seria o momento. Ele perdeu o momento ou talvez devesse ter apenas a paciência para esperar que um dia eles pudessem ficar juntos.
Alimentava a esperança como um jovem apaixonado, mas ele seguiria a vida dele. Talvez pudesse ter-la de volta. Lembrou de uma antiga frase que dizia que um verdadeiro homem não é aquele que conquista várias mulheres, mas aquele que conquista a mesma mulher várias vezes. Ele a queria mais uma vez ali, não longe, mas...
De perto.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Vai, se você precisa ir



"Meu amor, cuidado na estrada
E quando você voltar
Tranque o portão
Feche as janelas
Apague a luz
e saiba que te amo..."


Quando você voltar
Legião Urbana






Era intenso demais para meus olhos contemplarem.
Busquei por tudo que lhe agrada a alma e o coração.
Agora devo ter paciência e por isso estou tentando.
Você se foi, mas não sei se ainda pensa em voltar.
Não sei se ainda pensa em mim ou se amei sozinho.
Talvez tenha sido erro meu ou talvez tenha sido seu.
Então quem sabe simplesmente não houve erros,
mas apenas o momento errado para nós...

Única coisa que sei é que só você me faz falta.
Aquele olhar voluptuoso de completa admiração.
Seu cheio embriagante que tira minha prudência.
Aquele gosto que teima em ficar em minha boca.
Seu rosto levemente levantado à espera do beijo.
Logo antes dos seus lábios massagearem os meus.
Todo aquele sentimento que trazia conforto e
que me deixava estupidamente apaixonado...

Apesar de tudo você partiu me deixando aqui.
Não quero ficar apenas vendo você ir embora.
Era bom demais quando você se aconchegava.
Eu sei que tudo está mudando muito rápido.
Existem coisas tristes ainda não ditas por você.
Como posso cobrar se existem segredos em mim.
Logo eu não vou impedir você de ir então vá,
mas apenas posso esperar que volte logo...

Tudo mudou quando você esteve aqui.
Receio que nada mais voltará ao normal.
Deixou um vazio e eu não sei se existiu algo.
Mesmo assim eu sei que sou uma nova pessoa.
Eu ainda estou bem porque foi bom ter você.
Espero sua volta sabendo que pode ser em vão.
E se você voltar fique comigo e não olhe para trás,
pois deixe que agora eu cuidarei de ti...

Então quem sabe simplesmente não houve erros,
mas apenas o momento errado para nós...
Todo aquele sentimento que trazia conforto e
que me deixava estupidamente apaixonado...
Logo eu não vou impedir você de ir então vá,
mas apenas posso esperar que volte logo...
E se você voltar fique comigo e não olhe para trás,
pois deixe que agora eu cuidarei de ti...

sábado, 12 de novembro de 2011

Asas...


Aqueles senhores querem que você não conquiste.
Dizem que a vitória não é para pessoas como a ti.
Mentiras elaboradas para tirar sua vontade.
Para que se sinta derrotado antes de tentar.
Abra suas asas e voe o mais alto que puder.

Tens o direito de conseguir o que queres.
A capacidade de buscar aquilo que é seu.
Não se intimide pelos obstáculos ilusórios.
Amarras invisíveis que pervertem a verdade.
Abra suas asas e voe o mais alto que puder.

Todo aquele esforço valerá à pena.
Esse é o momento de fazer e vencer.
Não há mais motivo para olhar para trás.
Tudo que precisa está contigo mesmo.
Abra suas asas e voe o mais alto que puder.

Mostre tudo o que aprendeu com calma.
Mas grite para que todos possam saber.
Você está veio até aqui e nada te para mais.
Está no lugar que merece e vai ainda mais longe.
Abra suas asas e voe o mais alto que puder.

Fortaleça seus sentidos e afie sua vontade.
Não deixe que te arranquem seus sonhos.
Nunca acreditem que possam fazer isso.
O que é seu apenas você mesmo pode perder.
Abra suas asas e voe o mais alto que puder.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Perda...


Quando se perde um amigo somos abatidos por uma tristeza sem fim.
Como se nosso porto seguro fosse invadido e perdemos o nosso chão.
Não temos mais aquele abrigo em que finalmente abaixamos a guarda.
Assim a dor só pode passar com ajuda acalentadora daqueles que ficam.
Apenas um amigo, mesmo sem substituir, pode curar a perda de outro.
No entanto, alguns amigos podem ser impossíveis de deixar partir.
O amor é tão grande que se torna difícil não o querer bem pertinho.
Às vezes não perdemos um, mas vários de forma constante e inexorável.
Perdemos a direção e nos sentimos solitários, mesmo em meio de muitos.
O sentimento de perda nos faz tentar mudar toda essa cruel situação.
Mas como pedir para ficar, sem acabarmos sendo totalmente egoístas?
Querer próximo não é prender e a felicidade não está na obrigação.
Assim o vemos partir calados e mergulhados em nossas próprias lágrimas.
Vazio que nunca será preenchido e talvez jamais sanado pelo tempo.
Aos que ficam resta apenas a saudade, pois esta sim está sempre presente.

O Lobisomem de Minas




“Em presença de tal apelação, mais brabento apareceu a peste. Ciscava o chão de soltar terra e macega no longe de dez braças ou mais. Era trabalho de gelar qualquer cristão que não levasse o nome de Ponciano de Azevedo Furtado. Dos olhos do lobisomem pingava labareda, em risco de contaminar de fogo o verdal adjacente. Tanta chispa largava o penitente, que um caçador de paca, estando em distância de bom respeito, cuidou que o mato estivesse ardendo.”
O Coronel e o Lobisomem
José Cândido de Carvalho



Era uma noite quente e fazia vários dias que não chovia naquela pequena cidade do interior de Minas Gerais. Na verdade aquela estiagem estava castigando toda e região e alguns fazendeiros estavam começando a se preocupar com suas plantações de milho, principalmente depois com a atual crise política. Todos já haviam se acostumado com tantos planos e mudanças da moeda, mas era mais a população de baixa renda da diminuta cidade que sofria tanto com o calor intenso quanto pela má administração do governo federal. No entanto, isso era o que menos preocupava a simples e velha senhora Marta Ferreira das Lourdes.
Dona Marta estava mais preocupada com seus netinhos, que acabaram de perder a mãe, vítima de tuberculose, deixando duas pequenas crianças aos seus atenciosos cuidados. A infanta mais nova, chamada Maria, tinha apenas sete anos e o mais velho que se chamava João tinha nove anos. Claro que o pai, o mecânico Lucas Ferraz Nogueira, ajudava a criá-las como podia, mas como ele trabalhava muito e acabou deixando a cargo de sua sogra a criação dos pequenos. Fora o problema com a bebida que Lucas tinha desde que a esposa faleceu, mas a senhora Marta apenas se preocupava com as crianças e como as educaria praticamente sozinha.
A avó estava contando uma estória infantil para as crianças dormirem. Tinha sido um dia duro para todos, mas os netos ainda estavam um pouco ativos demais naquela noite, talvez devido ao calor. Assim a senhora resolveu ler o que sua falecida mãe narrava para fazê-la dormir anos atrás. Era o conto da Capelzinho Vermelho e talvez não tenha sido uma boa escolha para aquele momento, mas João tinha dormido rapidamente e apenas a garotinha ainda estava acordada. No entanto, subitamente Dona Marta parou devido à voz da netinha que embora fosse delicada, acabou assustando a mulher de forma impressionante.
A pequena Maria era uma menina sempre alegre e falante, mas tinha ficado praticamente muda depois da morte da mãe, por isso a avó tinha estranhado tanto a criança falar naquele momento. Não conseguia se lembrar mais da última vez que ouviu a voz da querida neta, mas de certa forma, apesar do susto, ficou estonteantemente feliz por finalmente escutar a voz da garotinha novamente. A alegria fez com que a mulher não ouvisse o que foi dito, mas a neta repetiu:
- Ô vó, por que coisas tão ruins aconteceram com a Chapeuzim?
- Porque ela desobedeceu à mãe e foi para a floresta! – respondeu dona Marta – Não pode sair em um lugar estranho sem que os adultos saibam, minha netinha. Lembre sempre disso. É perigoso lá fora! Ocê pode encontrar o Lobo Mau...
- Vó... pra onde a mamãe foi?
A velha senhora respirou fundo. Sabia que aquela pergunta derradeira chegaria cedo ou tarde e por mais que tivesse se preparado pra ela, foi pega em total surpresa e descobriu que seria doloroso responder que sua amada filha, mãe da garotinha, nunca mais voltaria. Também causava tristeza em dona Marta falar sobre isso, pois também sentia falta dela, mas antes de tudo deveria confortar sua neta. Deveria esquecer sua própria dor para acalentar sua querida Maria...
- Minha querida... ela está no céu! Está com os anjim do Nosso Senhor.
- Ela não vai voltar mais?
- Uai, ocê vai ver ela de novo! Quando for ao paraíso também, mas não agora. Vai encontrar novamente sua mãe, mas não agora...
Dona Marta sentiu uma lágrima correr–lhe a face e não pode continuar. Suspirou profundamente e fechou os olhos tentando se acalmar. Ela não queria que sua neta percebesse a sua angústia. A carinhosa avó queria poupar a pequena Maria de mais dor e tristeza. Tudo aquilo era pesado e injusto com a menina.
- Não queria que ela fosse, vó. Eu odeio a mãe!
- Ela não teve culpa minha neta... não a odeie! É a vontade de Deus...
- Então eu odeio Deus!
Um ruído agudo de vidro sendo quebrado seguido por uma bravata rompeu subitamente o silêncio da noite e que assustou as duas, avó e neta, que pularam abaladas pelo barulho. Era o pai das crianças chegando mais uma vez bêbado em casa. Com certeza Lucas tinha passado no bar depois de ter trabalhado, se é que ele esteve realmente na oficina naquela tarde. A dona Marta olhou para o menino e viu que ele ainda dormia. Menos mal! No entanto, o garoto se moveu quando mais um estrondo ecoou pela casa. Dona Marta deu um beijo carinhoso na garotinha e foi ver seu genro antes que esse acordasse toda a vizinhança.
A doce Avó foi atravessando o pequeno quarto calma e silenciosamente. Chegou à estrada do cômodo, próximo ao corredor, e foi fechando a porta...
- Vó! – exclamou a menina – Deixa a porta aberta!
- Uai, ocê ainda tem medo do escuro?
- É...
Dona Marta não queria deixar a porta aberta, pois as crianças poderiam ouvir seu pai e perceber o estado deplorável que ele com certeza se encontrava. No fundo Lucas era um bom homem, mas a perda da esposa tinha sido demais para ele, ou melhor dizendo, demais para todos. A única que estava forte era a avó, mas mesmo assim ela sabia que era aparente, logo cairia. O que seria desta família se isso acontecesse? Quase desabou na frente de sua menina! Não, dona Marta tinha que ser mais firme. Ela contemporizou sobre a questão e resolveu ascender o abajur e assim poder fechar o cômodo adequadamente.
- Assim está melhor, minha netinha?
- Sim vovó! Obrigada!
- Amanhã é sábado! Dia de irmos ao parque, então durma logo!
- Ah, isso é bom demais da conta!
- Não é? Boa noite!
- Boa noite vó!
Resolvido o problema a avó foi cuidar de seu embriagado genro e saiu do quarto das crianças. Era algo que infelizmente estava virando uma rotina e dona Marta não gostava nem um pouco disto, mas não havia muito a se fazer agora.
A pequena Maria fechou os olhos e tentou dormir. A perda de sua mãe ainda era recente e sempre era difícil dormir. A saudade era indescritível e como em todas as noites a garotinha começou a chorar silenciosamente. No entanto, seu irmão, que nada percebeu, levantou da cama rapidamente e foi até a irmã.
- Vamos agora?
- Nem quero mais ir. – disse a pequena Maria – Não ouviu que a vó disse?
- Ah, o Paulim achou um trem lá. Falou que era da banda que tocou ontem e eu to doido ver!
- Vamos ver amanhã na aula!
- Nem! Sem chance! Quero ver agora!
- Mas e se aparecer o Lobo Mau?
- Uai! Eu mato nele com minha Espada de Greyscow!
- Sua espada? – ralhou a menina – Acha que é o He-man?
- Se não vai, eu vou sozim mesmo!
- Tá! Vou cocê, mas vou levar a Fifi!
Maria se agarrou a sua mais querida boneca, única feita de porcelana e seguiu o irmão. O casal de garotos saiu do quarto pela janela e com todo o barulho que seu pai bêbado estava fazendo, ao resistir à ajuda da sogra, não foi difícil para que os pequeninos fossem soturnos.
Ganharam rapidamente as ruas recém asfaltadas da cidadezinha em direção a casa do amigo Paulo. Um pouco longe dali, era verdade, por isso as crianças tiveram que andar muito. Entretanto estranhamente naquela noite não havia muitas pessoas andando pela cidade. Estava muito tarde e embora à iluminação fosse precária, a luz da lua cheia ajudavam muito os irmãos.
Havia um silêncio perturbador naquelas ruelas e o medo estava dominando cada vez a menina, mas o pequeno João estava corajoso andando com sua espada de plástico em punho e a confiança que apenas uma criança inconseqüente poderia ter. No entanto, o menino parou quando ouviu o som mais aterrorizador que já tinha escutado em todos os seus poucos anos de vida.
- Nó! O que é isso? – perguntou Maria – Ouviu?
- Si... Sim! – respondeu o irmão tentando recuperar a coragem – Mas não deve ser nada!
Ouviram aquele som medonho novamente e desta vez seus pequeninos ossos gelaram de tal forma que mal podiam se mover. Um som primitivo e ameaçador ecoava nas ruas da cidadezinha e mesmo as pessoas que estavam dormindo em suas casas acordaram aterrorizadas apenas para se encolherem ainda mais em seus lençóis ou se esconder covardemente para debaixo de suas camas tremendo irracionalmente em puro pânico.
O som provocava um medo avassalador!
Era um uivo tão sinistro que não poderia ser de um simples lobo comum. Havia uma força maligna naquilo, certa malícia perversa e enlouquecedora. As frágeis crianças estavam totalmente abandonadas e perdidas nas escuras calçadas da pequena cidade no interior de Minas Gerais.
João foi o primeiro a ver o vulto enorme que se formava bem na sua frente e o rosnado selvagem que aquilo produzia. Sentiu um cheiro nauseante de suor que quase causaram vertigem ao garoto. Ele tentou avisar a irmã, mas não conseguia mover um músculo sequer de seu miúdo corpo.
A criatura se movia lentamente se aproximando cada vez mais fazendo fumaça com sua respiração ofegante. O menino pode fitar os olhos dele que brilhavam em tom avermelhado e assustador.
Subitamente a coisa se moveu furiosa e de maneira muito rápida! João mal pode gritar antes de ser abatido pela bocarra daquilo. A primeira mordida foi logo na garganta que fez o garoto espernear. Garras rasgavam a carne com facilidade, mas foi apenas a segunda mordida que fez o menino finalmente tombar imóvel.
A menina naquela altura já tinha se posto a correr apavorada, mas seu caminho foi barrado pelo corpo do irmão que foi lançado contra o seu. A primeira coisa que ela viu foi sangue! Retalhado, jorrava sangue por toda parte do corpinho de João.
Apenas depois a indefesa Maria pode perceber que seu algoz já estava em pé na sua frente. A criança deu um berro alto, mas que fora abafado por mais um uivo tenebroso...


Continua...


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segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Contenda...


“Aquele que luta com monstros deve acautelar-se para não tornar-se também um monstro. Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você.”
Friedrich Nietzsche



A tormenta tinha trazido nuvens tenebrosas e cruéis.
A vontade do Senhor caiu sobre o campo em assas e aço.
Arcanjos trazendo o crepúsculo de toda a maldade.
O punho direito de Deus em uma falange da alvorada.
E o céu se abriu sendo trespassado pelos feixes divinos.

Hostes infernais se batem contra os guerreiros da luz.
Mas nada pode refrear Seu poder incomensurável.
Inexorável como o destino e inevitável como a morte.
O medo se alastra a aqueles que trazem o terror.
E a Terra é consagrada mais uma vez para as alturas.

Não se podem compreender os desígnios da deidade.
Como entender criaturas tão magníficas e perfeitas?
A força mais pura e bela dos sete paraísos platinos.
Mas com a espada sempre suja de sangue abissal.
E os servos Dele choraram por aqueles que abateram.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A Menina que Chorava


“Estória: No sentido de conto popular, narrativa tradicional das manifestações da literatura oral em prosa. Havia a necessidade de ser empregado estória para as narrativas, os contos tradicionais, ficando História para o sentido oficial do vocábulo.”
Dicionário do Folclore Brasileiro
Luís da Câmara Cascudo



Estava tudo no mais perturbador silêncio naquela antiga escola em uma madrugada chuvosa e com trovoadas espaçadas. Mesmo assim, durante dias como aqueles o colégio deveria estar lotado de alunos do supletivo em seus corredores, mas não era o que estava acontecendo ali desta vez. Nas noites anteriores havia ocorrido um crime com um dos alunos da oitava série que naturalmente cursava de manhã.
Era Ricardo de Andrade Silveira que tinha passado a tarde inteira jogando basquete na quadra da escola e foi o último aluno a sair do vestiário naquele fatídico vinte e nove de março de ano de 1992.
Ninguém sabe ao certo o porquê do garoto ter ficado mais tempo na escola e o que o levou a subir as escadas para ir ao banheiro do andar superior. Entretanto isso não era o mais estranho no caso. Curioso e inexplicável é como alguém entrou no banheiro, matou Ricardo retalhando seu corpo e ninguém sequer ouviu o menino berrar por socorro. Apenas foi encontrado por outro aluno, do supletivo, que veio a ir ao banheiro por simples necessidades fisiológicas. Assim não é difícil entender porque aquele caso tem tido uma repercussão tão sensacionalista pela mídia e comovido tanto a misericordiosa sociedade daquela cidade.
Logo, a escola estava interditada nos dias que seguiam o crime e as aulas pararam completamente. Era para a escola estar completamente vazia, mas esse não era o caso daquele dia frio de março. A curiosidade, para o bem ou para o mal, sempre moveu os homens e provavelmente foi isso que levou dois garotos estarem da escola naquela noite chuvosa...
- Juninho? – disse um dos meninos – Acho melhor voltarmos!
- A cara... Não vai amarelar agora né? Parece boiola, meu!
- Sei lá, essa escola ficou meio sinistra depois que o Ricardo morreu!
- Para com isso! Estamos aqui por conta disso, doido!
- Não cara é sério! Vamos sair daqui!
- Já deu Carlos! Se quiser voltar é por sua conta!
- Não volta comigo?
- Nem que a vaca tussa!
- Tá bom! Vamos lá então!
Os dois garotos, que eram amigos de Ricardo, ficaram curiosos com o que aconteceu. Ao contrário do esperado que era ficaram com medo ou pelo menos comovidos com a morte do amigo, eles ficaram curiosos para ver onde seu colega morreu. Onde foi o crime mais hediondo que jamais ocorreu naquele colégio.
- O jornal disse que até parece que foi um bicho cara!
- Se a polícia pegar a gente...
- Ah, pega leve! Tá muito bolado cara.
Ambos começaram a subir a escadaria que dava acesso ao andar superior do colégio. Era onde ficavam as sétimas e oitavas séries. Apenas naquele momento os dois perceberam o quão barulhento era pisar naqueles velhos degraus de madeira envernizada. Carlos tropeçou quando ainda estava subindo e fez um estardalhaço enorme quando se estatelou no chão. Felizmente a queda não foi grande e o menino logo se levantou envergonhado.
- Ai cara, só você mesmo! – disse Júnior – Vai acordar...
O menino não teve tempo de falar, pois o barulho de passos irrompeu pelo andar superior da escola e isso assustou muito os dois. Eram sons tão fortes e claros que não davam para passar despercebidos. Aquilo gelou a espinha dos dois, mas aquela balburdia logo parou e o silêncio aterrador voltou.
- Vamos embora daqui cara!
Desta vez Júnior simplesmente ignorou o amigo e subiu correndo o mais rápido que podia sendo finalmente seguido por Carlos. O garoto queria descobrir quem estaria no andar superior e os dois chegaram rapidamente ao banheiro em que o crime tinha ocorrido. Novamente não ouviam nada e continuaram a andar furtivamente, mas notaram uma coisa realmente estranha. A luz do sanitário estava acessa! Alguém realmente tinha estado ali e aquilo não estava correto. Novamente sobre os protestos de Carlos, o menino continuou.
Entraram no local onde Ricardo havia sido assassinado e perceberam facilmente que alguém já tinha limpado todo o lugar.
- Tá vendo? – disse o medroso menino – A polícia já investigou tudo! Vamos embora!
- Meu, dá pra calar essa boca? – esbravejou Júnior – Ouviu isso?
- O que?
- Isso!
Ambos ficaram quietos e assim se pode ouvir um estranho som que não passava de um murmúrio. Parecia um lamento ubíquo que parecia estar vindo do além. Um choro tão baixo que os dois se perguntaram como tinham conseguido ouvir.
- Sabia que tinha alguém mais aqui! – disse Júnior – Acho que está em um dos sanitários! Venha!
- Cara, isso vem de todo o lugar!
- Não encana Carlos...
- Tá bom, mas pega leve. Acho que é uma menina!
- Podia ser a Karine heim?
- É ruim heim? Nem ferrando que aquele filé estaria aqui, mas se tivesse nós teríamos uma surpresa para ela né?
- Isso seria massa!
Os dois meninos foram entrando no banheiro em direção as divisórias que separavam cada privada. Júnior se abaixou para ver por baixo e não viu nenhum dos pés de nenhuma criança, quanto mais uma garotinha. Como o choro ficava mais alto e focado à medida que eles se aproximavam e o jovem foi se guiando pelo som. Ao julgar estar na porta certa ele a abriu tão repentinamente que assustou seu amigo.
Havia, sentada em cima da privada, uma menina que chorava.
Estava trajada com um vestidinho branco com detalhes azuis de algum tecido que parecia ser algodão. Estava todo rasgado e a garotinha estava com meias sujas e com um dos sapatinhos pretos desamarrados. Estava igualmente imunda e com os longos cabelos loiros todos emaranhados. Ela se sentava com as pernas dobradas e tampando o próprio rosto onde tremia e chorava parecendo ignorar que os dois estavam bem na frente dela.
Os meninos acharam aquilo estranho e não entendiam porque a menina estava lá, mas resolveram falar com ela embora não parecesse ninguém que conheciam e estava vestida com uma roupa totalmente estranha, mas parecida com um uniforme de alguma escola das redondezas.
- Garotinha?
Ela não respondeu.
- Menina, por que você está chorando?
- Por quê? – perguntou à loirinha como em não mais de um sussurro, mas olhando fixamente para Júnior com seus olhos profundos e azuis – Por que vocês foram meninos muito maus!
Os gritos que se seguiram foram tão altos e aterrorizadores que provavelmente seriam ouvidos na rua se a chuva não estivesse tão forte. Relâmpagos e trovoadas rompiam os céus enquanto o banheiro, o mesmo local que tivera sido palco da morte do pobre Ricardo, era tingindo de vermelho novamente. Um espetáculo bárbaro e insano que voltou para a escuridão do silêncio da noite...

Continua...

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segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Aqueles versos escritos na areia...



Aqueles versos escritos na areia.
Juras de amor que não importam mais.
Palavras ditas que nunca foram ouvidas.
Afeto que se sentiu apenas sozinho.
Esperança abalada pela desilusão.

Aqueles versos escritos na areia.
Coração doado a mãos duras.
Sangra na falta do acalento.
Pulsando em vão por ti.
Busca por algo que nunca esteve lá.

Aqueles versos escritos na areia.
Flores que nunca foram entregues.
Planos que ficaram apenas nos sonhos.
Momento fora do seu tempo.
O fim de todas as coisas.

Aqueles versos escritos na areia.
Choro quente debaixo da água fria.
Querer bem afastado pela razão.
Grito calado pelo silêncio.
Desespero na escuridão da noite.

Aqueles versos escritos na areia.
Feitos assim para que se esqueça.
Levados pelo mar da existência.
Que temam em ficar na memória.
Perdidos em algum lugar de mim.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Contos Cotidianos


Foi lançado a segunda antologia em que eu participo no dia 26 de março desse ano, mas apenas agora os livros chegaram. Contos Cotidianos é uma coletânia de estórias sobre o dia dia das pessoas e a vida comum. Meu conto no livro chama-se Amizade, mas foi publicado nesse blog como Cotidiano. Sem mais, aqui está a sinopse do livro.

"Este espaço não tem dono. Aqui não existem amarras da ética, religião, dogmas ou qualquer outro empecilho que possa, desrespeitosamente, atrever-se a impor censura.
A liberdade e a clareza de ideias neste livro não serão como animais selvagens que necessitem ser domados, tampouco devam ser ventos a girarem moinhos. Então, que destas ideias não se façam proveito, deixando-as correrem livremente, soprarem sem direção certa, tendo na liberdade o único propósito. Refiro-me à liberdade de criação.
Estas linhas também são minhas, digo, não vêm com a agonia dos dias atribulados, embora falem sobre o cotidiano... Vêm como uma psicografia ditado por ele, quando consigo escapar das voltas do relógio e das exigências diárias, que roubam a criatividade e o tempo.
Quando escrevemos, tornamo-nos livres ou indiferente às comparações, avaliações ou julgamentos a que somos submetidos e aos quais nos submetemos constantemente... Perdemos a casca; criamos um espelho para ver o que não se enxerga na repetição dos dias.
Olhemos o cotidiano e, com criatividade narremos o que nossa observação e imaginação permita ampliar, modificar ou apenas uma prática rotineira, inserida na dureza do que parece imutável. Mergulhemos no cotidiano; escapemos também, nem que para isto tenhamos que mergulhar em águas, quase sempre turbulentas."

Sergio Prado.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O Tempo e a Lua


Raistlin Majere sentou-se pesadamente na pedra já sentindo os efeitos de sua costumeira vertigem devido ao esforço físico provocado pela longa demanda. Sua saúde estava muito debilitada, mas sempre falava para si mesmo e aos demais companheiros que era o preço a se pagar por tanto poder recebido das Torres de Alta Magia. Sua pele amarelada lhe dava ainda um maior aspecto doentio sem falar dos cabelos brancos, mas nada se comparava aos excessos de tosse. Esses eram horríveis.
O mago vermelho estava em uma caverna gelada, mas era bem mais aquecida que a paisagem lá fora. Estalactites e estalagmites frias brotavam diligentes, mas a fogueira que seu irmão prontamente acendeu deve ser o suficiente para trazer calor e luz. Um local isolado dos outros que sempre buscava para consultar seu grimório e preparar suas magias diárias. Um processo longo e dispendioso que lhe exigia muita atenção e dedicação. Gestos elaborados, palavras estranhas e componentes materiais exóticos que provocavam um efeito na trama e geravam uma determinada magia.
Entretanto, antes dele sequer pegar o livro, uma pessoa se aproximou pela entrada da caverna e isso já o irritou. Queria um tempo para si e seus novos “amigos” pareciam não quererem deixá-lo em paz. Era sempre assim e aquilo estava incomodando Raistlin de uma maneira que afetava seu físico e veio a crise de tosse.
Foi assim que Lua Dourada o encontrou. O aparente frágil arcano estava limpando a boca com seu lenço que se tingira rubro como seu robe. Aquela era uma doença eterna que o matava por dentro e estaria sempre mostrando que o poderoso mago era apenas um mortal no fim das contas.
- Veio me curar princesa exilada de Que Shu? – perguntou o alto mago – Receio que a incomode ser sacerdotisa da Deusa da Cura e andar em uma campanha com alguém tão enfermo como eu.
- Eu posso... – tentou começar ela, mas Raistlin a interrompeu com novos rompantes de tosse e se levantou ignorando-a.
O homem se afastou dela indo em direção a fogueira em chamas buscando um pouco mais de conforto e aparentemente deu certo, pois suas crises deram finalmente alguma trégua. Entretanto Lua Dourada o seguiu e sentou-se do lado dele. O arcano a encarou e viu apenas olhos amáveis. Deveria ser uma linda visão observar aquela mulher, mas o jovem não poderia vê-la da forma que os outros viam. Não podia ver ninguém da forma que os outros normais faziam. Seus olhos de íris em formato de ampulheta viam apenas a passagem do tempo e como toda a matéria se deteriora. Não era uma linda jovem que o alto mago via, mas uma mulher envelhecendo e isso o deixava ainda mais triste e pessimista. A real percepção das coisas como costumava dizer para si mesmo. Tudo está sempre morrendo.
- Porque sempre se afasta dos seus amigos? – indagou a clériga – Eu sei que algo o incomoda, mas posso ajudá-lo!
- E nada a faria tão feliz não é mesmo? – ironizou o mago – Por trás de seu aparente altruísmo está à satisfação pessoal de sanar os males de alguém como eu ou levar para o rebanho esse cordeiro desgarrado.
- Você não é maligno, o que todos falam sobre ti não é verdade. Eu sei que existe bondade em você!
- Ora, sabes de muitas coisas não é mesmo? A grande princesa dos bárbaros já sabe tudo ao meu respeito, mesmo depois do que? Alguns dias que nos encontramos pela primeira vez na Hospedaria do Lar Derradeiro? Agora tu e todos estes teus “amigos” conhecem-me perfeitamente não é mesmo? Sinto dizer querida que as profundezas da minha alma sejam bem mais espessas!
- Sei o suficiente para dizer que o que tens posso curar, mas é a ti que não queres que eu te cure.
- Parabéns, você adquiriu a incrível habilidade de perceber o óbvio!
A lenha fumegante estalou distraindo os dois e dissipando a tensão que havia sido criada pela conversa. Raistlin aproveitou o momento para se retirar e ir mais adentro das sombras da caverna. Com apenas uma palavra mágica, shirak, ele fez a bola de cristal na ponta do seu cajado se iluminar e o usou-a como um archote para que não fosse totalmente imergido na escuridão.
Lua Dourada o seguiu prontamente, pois não queria desistir ainda de seu companheiro. Não sabia se havia verdade nas palavras dele. Ela, como qualquer mulher com sua sabedoria e comprometimento, questionava-se o tempo todo. Perguntava se estava sendo útil a causa dos deuses. Perguntava se era realmente um instrumento da vontade deles.
Assim a sacerdotisa o seguiu.
Caminharam por alguns metros mais adentro da garganta da caverna e quando o frio voltou a incomodar, Raistlin parou e encarou Lua Dourada nos olhos. Aquela não era uma das visões mais agradáveis, pensou ela, mas estava focada em seu objetivo e pedindo forças a Deusa ela iniciou.
- Vocês magos se acham inteligentes e são mesmo! No entanto é uma qualidade adquirida exclusivamente pelo conhecimento. Tanto aprendem, mas pouco sabem o que fazer com isso. Os arcanos valorizam muito pouco a sabedoria.
- Entendo. – disse Raistlin – Acredito que apreciem sua intuição e capacidade de tirar deduções baseados no nada. Claro que conhecimento é inútil não é mesmo? Já que são sempre guiados pelos deuses!
- Não foi... – a clériga parou, pois apenas agora tinha entendido como suas próprias palavras soaram arrogantes. – Eu só estou tentando entender você. – agora Lua Dourada estava conseguindo ser mais humilde – Sei que acha que eu o ajudo por arrogância, mas eu realmente acho que tem um lado bom em ti e por algum motivo não mostras... talvez por...
- Medo! – completou o mago vermelho – Não acho que seja arrogância querida, mas com certeza não é altruísmo. Você ficaria muito satisfeita consigo mesma se me conseguisse “salvar”. Isso não condiz com altruísmo não é mesmo? A grande sacerdotisa da Deusa da Cura se importa mais com estar agradando sua própria divindade que com minha alma, disso tenho certeza!
- Sabe o que eu acho? – Raistlin não respondeu, mas olhou para ela atento. Assim Lua Dourada achou melhor prosseguir – Acho que você fala muito sobre mim mesmo dizendo que nos conhecemos pouco. Diz-me que não sei nada sobre você, mas sabes muito sobre mim não? Acho que fala assim pra esquivar do ponto principal de nossa conversa.
- Quer saber sobre mim? O cavaleiro já não lhe disse o bastante? Sou um arcano e por isso só posso ser maligno e ele está certo, devo ser justo, pois nada ficará entre eu e meus objetivos. Qualquer um que se opor a mim sofrerá conseqüências e isso meu irmão pode lhe dizer melhor que eu mesmo!
- Será mesmo ou isso é apenas a projeção que os outros fazem sobre você? Talvez goste dessa imagem, pois isso lhe protege como uma armadura. Se você os decepcionar logo no inicio não ficará com remorso quando abandonar aqueles que ama, mas sabe de uma coisa? Todos têm um propósito! Guiados pelos deuses ou não e o grande mago Raistlin também tem o dele e tenho certeza que é bem diferente que eu ou qualquer um de nós possamos imaginar.
- Existem sombras em mim Lua Dourada. Mais que possa imaginar e sua cruzada para me salvar falhará vergonhosamente.
- Existem sombras em você? Ora, meu caro, existem sombras em mim e no mais altruísta dos heróis de Ansalon! Tal como existe bondade no mais perverso dos corações. Acha realmente que dizer que eu falharei vai me fazer desistir?
- Não! – disse o arcano – No entanto essa sua visão maniqueísta do mundo vai fazer com que cometa erros e vai se arrepender deles no fim. Bem e mal não existem realmente, são apenas pontos de vista.
- Agora sabes do meu futuro?
- Sabe por que eu tenho esses olhos de ampulheta? Por que eu vejo o futuro e tudo se desintegrando no processo. Eu vejo a sua morte como vejo a de todas as pessoas que conheço ó grande Filha do Líder! Quando todos vêem a linda e perfeita Lua Dourada eu apenas vejo seu corpo envelhecer inexoravelmente.
Aquilo fez o coração da sacerdotisa descompassar. Ela tentou disfarçar, mas percebeu no sorriso de Raistlin que tinha falhado miseravelmente. Se o mago vermelho dizia a verdade aquilo deveria ser horrível. Ver tudo morrendo... Então a clériga o entendeu. Finalmente alguém tinha compreendido. Como poderia haver esperança em alguém que só via o mundo em decadência e ruína?
- Talvez eu não possa o compreender meu caro. Todo mago se gaba por não ser marionete dos deuses, mas acaba sendo influenciado também.
- Como assim?
Ele fez uma pergunta e Lua Dourada percebera que realmente tinha chamado a atenção daquele homem tão reservado. Era aquele o momento que ela poderia ajudar verdadeiramente. Ela tinha que atacar sua arrogância.
- Os deuses podem não guiá-lo, mas você, como todos nós, é influenciado pelo seu meio. Pelas pessoas que dizem quem você é e pelas circunstâncias impostas pelo seu destino. Tenta desesperadamente ser dono de seu destino, mas se entrega a algo traçado por fatores que acredita não estar em suas mãos.
- Eu sou o que eu mesmo faço de mim!
- Então me prove isso e faça com que todos vejam que você não é o mago que eles projetam em você, mas que é bem mais que isso. Não dominamos o futuro meu amigo, mas pode ser o mestre do passado e do presente.
- Realmente existe sabedoria nas palavras de uma sacerdotisa! No entanto, como saber se sou o que sou por mim mesmo ou pelo meio em que vivo?
- Realmente existe inteligência nas palavras de um mago! Não saber é o que deve nos motivar, meu caro. Sofremos decepções, mas são elas que fazem nossa vida mais interessante...
Os dois sorriram e a imagem do arcano não era mais assustadora para Lua Dourada como a imagem da clériga não era mais tão mórbida para Raistlin.
- Receio que a decepcionarei sacerdotisa!
- Mesmo? Acho que ficará surpreso do quanto coloco minha fé em ti. Acho que você nos salvará antes do fim. Acredito mesmo!
- Eu vejo a morte minha querida e seu fim será com um grande sacrifício e isso é tudo que vou revelar sobre sua morte.
- Então é tudo que preciso saber e fico feliz, pois me mostraste agora que servirei a causa plenamente. Como disse, ainda há bondade em você.
Lua Dourada se afastou do mago deixando-o em suas próprias sombras na penumbra da caverna. Raistlin a acompanhou com o olhar enquanto podia e contemporizou sobre as ultimas palavras que ela disse. Os últimos momentos dela, que o mago tinha visto com seus olhos de ampulheta, estavam claros na mente dele, pois aquela visão também era sobre seu próprio futuro. Talvez não exista mais bondade nele, mas existe amor e estava preparado para matar aquilo que nunca tinha existido.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Adeus.


“Ela se vestiu, e se olhou;
sem luxo, mas se perfumou.
Lágrimas por ninguém,
só porque, é triste o fim.
Outro amor se acabou.”
Ela disse Adeus – Os Paralamas do Sucesso

A menina caminhou entre as ameias floridas da primavera, mas mesmo com todas aquelas cores, a alegria não atingia a sua alma. Sua mente não estava ali, mas no quarto que acabara de sair, de ter sido abandonada. Pensou em olhar para trás uma última vez, talvez buscando aquele que a tinha deixado, mas desistiu rapidamente desses pensamentos e só pensava como ainda não havia chorado. Depois de tudo que aconteceu, não tinha derrubado uma lágrima ainda.
Aquilo tudo era tão injusto, tão derradeiramente injusto. Ela o tinha amado tanto, talvez mais que os outros e mesmo assim tudo tinha dado errado. Realmente tentou fazer tudo certo desta vez. Prometera a si mesma a nunca se entregar totalmente de novo, devido a decepções passadas, mas não tinha conseguido evitar. Ele era tão apaixonadamente charmoso. Seu sorriso era tão lindo e as marcas do tempo que se formavam em seu rosto lhe davam uma calma única.
Não queria, mas aconteceu e agora só podia lamentar por ter ocorrido da mesma forma que tantas outras vezes. Ela o amou, mas o fez sozinha como nos versos de Poe e pensou se em algum momento aquele lindo rapaz de olhos escuros gostou realmente dela em algum momento.
Tinha feito tudo por ele e foi em vão. Achou que naquele momento seria diferente. Apostou tudo por aquele homem. Tudo seu era de seu amado e ele tinha o coração dela nas mãos, mas preferiu partir em outras aventuras. Ela seria apenas mais uma daquelas aventuras, pois o amor tinha se fragmentado em mil pedaços como um vidro que se quebra e nunca mais pode ser concertado totalmente.
Mais uma vez ela estava sozinha e novamente às ironias do destino a exigiam força para seguir em frente. Sim! Seria forte, mas estava tão cansada de ser forte sempre. Tão cansada de nunca demonstrar seus sentimentos. Suas fraquezas. Isso a estava deixando dura e tinha medo que seu jeito a fizesse se tornar uma mulher sozinha e isso era, talvez, o que mais a assustava.
A jovem perdida meneou até um banco quase em vertigem. Sentou. Colocou as mãos ao rosto quente e as lágrimas salgadas finalmente deslizaram em sua pele alva como a chuva suave das tardes que teimavam não vir naquele dia. O dia estava feliz, era apenas ela que estava triste. Apenas ela. Foi então que olhou para trás e...
Ela disse adeus.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Doces Sonhos


“Sweet dreams are made of this.
Who am i to disagree?
I traveled the world and the seven seas.
Everybody's looking for something.”
Sweet Dreams

O que você fez comigo?

Algo tão recente e ao mesmo tempo tem tanta intensidade. As emoções tão a flor da pele, seja por um lado ou por outro. Gostar do que você faz é o mesmo que amar e achar ruim alguma atitude sua é o mesmo que odiar. Paixão inexorável para o bem ou para o mal.

Força avassaladora que se bateu contra mim vertiginando meus sentidos e revirando meu mundo de maneira tão assustadora. Arrebata meu juízo e faz com que eu surpreenda a mim mesmo. Tira de mim a mim mesmo. Retira os grilhões que eu mesmo prendi a mim, sejam eles justos ou não. Faz-me ousar o que nunca imaginei antes.

No entanto, o que mais me intriga é que mesmo assim eu tenho uma paz que nunca senti antes. Mesmo com medo eu me entrego e fico sereno diante da tormenta. Consigo perceber e entender bem todos os riscos e tudo que estou apostando, mas ainda sim eu sei exatamente o que quero e isso me traz uma estranha calma.

Intensidade e ao mesmo tempo suavidade. Sentimentos tão opostos que se misturam em minha alma e fazem com que eu me compreenda melhor. Fazem com que eu queira ser melhor, mesmo cometendo meus erros humanos. Foi o que essa dicotomia provocou em mim. Querer ser ainda melhor para você.

O futuro é incerto para nós. Disso eu sei e você sabe muito bem também, mas pense! Algo que gera essa profusão de sentimentos não poderia ser diferente. A magia nunca foi mais que um doce sonho minha querida. Tivemos nosso momento e aquela linda tarde ainda está em minha mente como muitas outras coisas que me faz lembrar você. Por isso eu não tenho receio do que há por vir, pois seja que rumo nossas vidas tomem ainda temos nosso momento. Pode ser passado, mas espero que seja presente também. Acho que minha pergunta inicial não faz mais sentido, pois eu deveria perguntar...

O que você faz comigo?

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O Quarto


Foi naquele desconhecido quarto escuro que derradeiramente estendeu o que tinha se passado e como aquela profusão de sentimentos o tinha entorpecido. Era como se estivesse sobre o efeito das drogas que os outros usavam festivamente fora dali. No entendo, se via sobre o efeito de uma química muito mais antiga e inexorável. Algo ainda mais profundo e bem mais complicado.

O Amor.

Tinha prometido a si mesmo não cair nesses meandros dissimulados e sentimentos platônicos, mas como sempre, isso realmente não se pode controlar. Percebeu o perigo bem antes, claro, e a mantinha distante, entretanto algo os aproximou e os levou para aquele quarto.

Como ele poderia evitar?

Havia algo na forma que ela se movia que encantava. Talvez na maciez do seu andar ou talvez na forma que o vento acariciava-lhe os cabelos escuros. Não sabia. Apenas tinha certeza que aquela pequena o tinha abalado de tal forma que era difícil se manter longe. Penoso ter que esconder todo aquele sentimento dentro de si... e ela se movia.

Ela se movia.

O apaixonado olhava a sua musa se virar na cama. Era tão calmo a ver dormir que o rapaz agora ignorava as risadas e sons que vinham de fora do quarto. Somente havia aquela respiração profunda que mesmo assim era de uma leveza incomparável. A moça tinha abandonado as cobertas e ele podia ver os primeiros brilhos do alvorecer adentrar pelas frestas da janela e tocar-lhe a pele alva e cremosa.

Puxou-a para si.

Ela prontamente respondeu sem nem precisar ser instada. Abraçaram-se da forma em que ele ficaria as suas costas e a jovem meneou a fim de buscar-lhe os lábios, mas estes não se aproximaram. Houve dúvidas em sua mente e confusão na dela, mas ambos se aproximaram ainda mais. A moça se virou manhosamente e com as mãos deslizando por seus cabelos, com calma e firmeza, suas bocas se tocaram novamente.

Beijo.

Era tímido e suave, mas ascendeu de forma vigorosa que provocou uma força desesperada em ambos. Não mais entendiam o que aconteciam e estavam tão perdidos como toda a confusão que acontecia fora dali, mas ao mesmo tempo estavam calmos e certos do que estavam fazendo. Não pensavam no passado e nem no futuro. Pensavam no presente que aquele momento tinha proporcionado aos dois apaixonados. Era tudo o que existia para eles.

Apenas um momento naquele quarto esquecido.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Celofane


Em meio a uma profusão de personalidades.
Palavras cruzadas e idéias ascendendo.
Mudos esquecidos em plena atividade.
Ignorados em sombras ressentidas.
Sozinho no olho de um furação.

Crepúsculo dos sentimentos de falta.
Isolado pelas alegrias alheias.
Querer estar e nunca ser lembrado.
Abismo que separa os olhares.
Longe da busca dos corações.

Saber da presença, mas não encontrar.
Reconhecimento apenas de mim mesmo.
Esquecido em meio aos egos inflados.
Perda das palavras de acalento.
Um deserto de grãos de areia.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Tempo e Espaço


A eminência do êxtase no momento.
Os lábios desejosos que sobem com delicadeza.
Quando os pés abandonam o firmamento.
A coragem que torna a vertigem em certeza.

As almas se dilatam pelo intenso prazer.
Tocam e expandem pelo além da consciência.
Tudo transforma e não há mais o que fazer.
Arrebatados pelo medo da ausência.

Um é de outro e outro é de um.
Eu não sou mais e não a mais você.
Junto e misturado como se fosse um.
Plenamente dentro de você.

sábado, 24 de setembro de 2011

Mãos que tocam o coração...


Tão longe do coração e tão longe do alcance das mãos...
Tenho sonhado com você, mas são apenas desejos esquecidos.
Chamo-te cada vez mais alto, mas você não vem para mim.
Tento lutar contra, entretanto receio que você quer assim.
Caindo nas ironias de minh’alma em versos nunca lidos.

Tão perto do coração e tão longe do alcance das mãos...
Acho que ainda não tenho a sabedoria de compreender como é possível.
Gostar tanto de uma pessoa e sofrer ao mesmo tempo e mesmo assim.
Não sentir vontade de me afastar, mas te querer mais perto de mim.
Assim não ser correspondido me parece também tão incrível.

Tão longe do coração e perto do alcance das mãos...
Tento me aproximar, mas você nunca me deixa entrar plenamente.
A porta parece ser sempre fechada para mim, apenas para mim.
Sinto uma desolação inexorável, como se me afogasse em um mar sem fim.
Quero apenas ficar acolhido em você para nunca mais poder sair totalmente.

Tão perto do coração e tão perto do alcance das mãos...
Conquisto você a cada dia, pois não há mais nada o que posso fazer.
Espero que um dia, sinceramente, você aceite tudo que há em mim.
Talvez um dia exista felicidade e que essa história tenha um fim.
Se não, eu tenho meu amor perdido, que apenas você pode trazer.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

É o que todos dizem...


É o que todos dizem sobre a Esperança.
Sonhos impulsionam mesmo a humanidade?
Otimismo vence sempre o desespero?
Força de Vontade nos faz seguir em frente?

É o que todos dizem sobre os Obstáculos.
Seriam esses muros altos demais?
Somos realmente capazes de superá-los?
Existe mesmo um prêmio do outro lado?

É o que todos dizem sobre a Estrada.
Sobreviveremos ao ardor das dificuldades?
Resistiremos à labuta do caminho?
Achar-nos-emos em meio aos meandros da vida?

É o que todos dizem sobre o Combate.
Lutar sempre é o que devemos fazer?
Temos sempre um inimigo para enfrentar?
A vitória sempre é algo esperado?

É o que todos dizem sobre a Justiça.
O mundo sempre está em equilíbrio?
As boas ações são mesmo recompensadas?
A voz do povo sempre é a mais correta?

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Desejo dos Sentidos


É o que em meus lábios buscam.
Desbravando cada gota em sua pele.
Encontrando a paz somente em sua boca.
Degustando toda a imensidão de sua alma plena.
A doçura de um sonho que me faz desejar o segredo...

É o que em minha pele queima.
Batendo contra mim mesmo como o destino.
Ardendo ao toque como as chamas da insanidade.
Fumegando um sentimento instigante, mas onírico.
A maciez de um sonho que não me faz desejar a paixão...


É o que em meus ouvidos ecoa.
Caindo nos perigos da sua vontade.
Perseguindo as vibrações de sua voz.
Caindo pelas trovoadas de sua chegada.
A canção de um sonho que me faz desejar o temporal...

É o que em minha íris congela.
Guardando momentos de pura magia.
Seguindo o brilho daquela estrela gélida.
Projetando esperanças em uma praia vazia.
A luz de um sonho que me faz desejar a perdição...

É o que meu sentido inspira.
Farejando no ar o seu perfume.
Inebriando todos meus sentidos.
Levitando em um profundo êxtase.
A suavidade que um sonho que me faz desejar o amor...

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Nova Amiga



O que posso escrever sobre aquela que me ganhou tão rápido?
Chegou tão suave e inexorável como uma avassaladora tormenta.
De olhos que, embora sejam escuros, possuam brilho intenso.
Cuja amizade sempre foi sincera e não laboriosa de conquistar.
Possuidora de um sorriso que afugenta as tristezas mais profundas.
O abraço mais confortável que alguém poderia querer.
Garota de andar maroto e jeitinho meigo...


terça-feira, 5 de abril de 2011

Para Sempre...


“Sempre existirá Paris”
Humphrey Bogart
Casablanca



A jovem estava sentada em uma cadeira de metal em estilo moderno sutilmente afastada da mesa redonda com toalhas alviverdes. Embora estivesse na mais famosa avenida de Paris, o lugar estava relativamente vazio. O Montecristo Café era um local aconchegante com poucas mesas na rua protegida com toldos vermelhos. Eram servidos vários tipos de café, mas como uma brasileira ela estava acostumada a pedir um simples quando no máximo um capuccino.
No entanto, nada disso permeava a mente dela. Na verdade estava muito ansiosa a espera daquele que a tinha tirado de sua semana de trabalho. Ela estava na França representando uma firma portuguesa em que trabalhava desde que tinha se formado na faculdade de Coimbra e decidido não mais voltar ao Brasil.
Tinha sido uma coincidência incrível quando a moça descobriu que seu amigo de infância, que não via há quase 10 anos, também estava em Paris, mas este a passeio com sua família. Para ela era quase mágico saber que ambos estavam longe de seu país de origem, longe do local de trabalho, mas se encontrariam mesmo assim depois de tanto tempo separados. Isso se tornava mais forte sabendo que tinham sido namorados na escola. Aquele primeiro amor que se tornou difícil de esquecer, mas a vida e o destino tinham feito questão de separar.
A mulher estava muito ansiosa.
Será que ele ainda pensava nela? Será que em momentos tristes ou desilusões amorosas ele pensava nela e tentava entender o porquê aquele amor não tinha dado certo como ela sempre refletia? Será que ele ainda a amava?
A mulher afastou esses pensamentos ao ver seu antigo amigo se aproximar atravessando a Avenida Champs Élysées e a vendo já de longe. Ela achou fantástico o tempo não ter alterado quase nada nele e de perto pode perceber que nenhuma linha do tempo tinha maltratado seu lindo rosto. Entretanto aquilo a fez sentir certa vergonha de si mesma, pois sabia que não estava mais tão bonita como antes.
O rapaz a cumprimentou e a beijou no rosto educadamente. Ela sentiu sua própria pele queimar e imaginou se estava corada. Considerou-se uma idiota por ter sentimentos de uma estudante mesmo sendo mais velha e rezou para que seu amigo não percebesse a profusão se emoções que corriam por toda sua mente.
Eles conversaram e relembraram do passado fazendo aquela tarde ser longa e de certa forma onírica. Havia uma letargia no ar e parecia que os bons tempos tinham voltado pela força avassaladora da saudade. Ambos esqueceram das vidas que tinham e embora tinham revelados seus feitos um para o outro no início da conversa, os anos que passaram separados não importavam nem um pouco.
O dia atingia seu crepúsculo como aquele encontro e assim ambos falavam cada vez mais na tentativa débil de adiar o inevitável. Foi nesse momento que o amigo a fez a pergunta fatídica. Ele a indagou sobre o que tinha acontecido com os dois e como podiam não estar mais juntos.
A mulher ficou sem jeito e tentou disfarçar dizendo que não era ela que tinha se casado e estava com três filhos. Não era ela que tinha levado a vida por um caminho tão diferente e seguido adiante.
O homem sorriu e, olhando nos olhos dela, disse que nunca tinha amado tanto alguém como ela. Nunca uma mulher o tinha feito sonhar como aquela garota da escola. Seu primeiro amor. O primeiro amor de ambos...
Uma confusão de sentidos penetrou inexoravelmente na jovem que se levantou tentando se despedir de seu amigo... se despedir de seu amor. Ambos não tinham mais tempo para aquilo e a vida os tinha levado a caminhos tão diferentes que aquela conversa tinha se transformado em algo injusto e dolorido.
Entretanto ela mesma se surpreendeu deixando levar pelas suas emoções beijando o amigo...
Foi um beijo longo. Ele a abraçou com força e ao mesmo tempo com carinho em uma dicotomia que apenas um homem apaixonado era capaz de fazer.
O tempo simplesmente parou.
Se eles já estavam envolvidos por aquele sentimento apaixonado e saudosista agora ambos estavam totalmente arrebatados. Aquilo era forte demais para os dois e eles claramente tentaram aproveitar o momento ao máximo possível.
Seus sentimentos diminuíram e o casal se separou novamente. Mais uma vez um sorriso torto se formou no rosto do homem fazendo a moça sorrir com facilidade.
Ambos sabiam que aquilo não iria para frente. Sabiam que se despediriam ali e cada um iria tocar sua vida sozinho, pois não havia mais espaço para aquele sentimento na rotina deles.
Eles partiram.
Sem um saber do outro, os dois lembraram do antigo filme preferidos de ambos nos tempos de escola. Tinham visto Casablanca juntos pela primeira vez no inicio do namoro juvenil e o tinham escolhido como símbolo do sentimento deles. Mal sabiam que a frase de Rick Blaine, personagem interpretado pelo ator estadunidense Humphrey Bogart, seria tão marcante e propícia como agora.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O Segredo de Crisálida


Olá a todos!
Primeiramente venho pedir desculpas por não postar nada no blog por um bom tempo, mas estou envolvido em algumas estórias grandes demais para colocar aqui e se alguém desejar acompanhá-las pode acessar o site http://www.fanfiction.com.br/fizban
Hoje venho usar um pouco deste espaço para comentar sobre o lançamento de meu primeiro escrito na antologia de poemas chamada “O Segredo de Crisálida.”
Lançado dia 29 de janeiro deste ano na Biblioteca Alceu Amoroso Lima em São Paulo capital, o livro reúne vários autores organizados pela Andréa Catrópa e editados pela Andross.
Meu poema presente nessa antologia chama-se “Sombra” e já foi postado ano passado aqui mesmo nesse blog.
Fiquei muito contente pela aposta que a editora Andross e seus organizadores depositaram em um de meus trabalhos e me sinto realizado de certa forma.
Sem mais eu apresento a sinopse do livro e espero postar mais contos e poemas nesse blog em breve.

“O estado de permanente transição a que estamos condicionados talvez seja a essência inegável da vida. Tudo o que nos remete à passagem do tempo revela mutação. Lentas e graduais, ou bruscas e repentinas, as diversas transformações que vivenciamos cotidianamente irrompem como movimentos definidores de nossa identidade e construtores de nossa trajetória. A poesia é uma das formas mais frutíferas de expressão das metamorfoses. E, quase sempre, não se pode prever qual é o resultado das mutações. Então fica o mistério. É como tentar descobrir o segredo da crisálida.”

Muito Obrigado a todos que têm me acompanhado tão fielmente!