segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

O Exorcista de William Peter Blatty


Livro do gênero de ficção de terror estadunidense escrito por William Peter Blatty e publicado em 1972. O Exorcista também teve sua versão para filme em 1973 sendo adaptado para o cinema de forma muito fiel, pois contou com o trabalho do próprio autor que também é roteirista. O livro foi reformulado por Blatty para uma edição comemorativa de 40 anos e essa resenha é uma critica justamente a essa versão traduzida pela Carolina Caires Coelho. 
            O escritor se baseou em uma matéria jornalística “real” sobre um garoto de 14 anos cuja família alegava que o mesmo esteve sofrendo de possessão demoníaca. Essa história do garoto real também é relatada no livro do Thomas B. Allen chamado O Exorcismo que também narra como os eventos serviram de inspiração para Blatty.


William Peter Blatty é um escritor e roteirista nova-iorquino aclamado principalmente por essa obra, mas foi autor de outros livros como A Nova Conspiração de 1978 e O espírito do Mal de 1983.  Ganhador de um Oscar por sua fiel adaptação ao filme de 1973 dirigido por William Friedkin e também trabalhou no roteiro de outros filmes pouco conhecidos como Lili, Minha Adorável Espiã de 1970, dirigido por Blake Edwards e chegando a dirigir O Exorcista III em 1990, baseado em outro de seus romances chamado Legião de 1983.
O Exorcista conta a história da atriz em ascensão Chris MacNeil e o drama com sua filha de 11 anos Regan que tem mudanças bruscas físicas e psicológicas, bem como também narra a trajetória do padre Damien Karras que recentemente teria perdido sua mãe acreditando ter negligenciado ela e não mais consegue se conectar espiritualmente com seus afazeres para com a Igreja Católica.
Embora o próprio autor diz ter “caído do gênero de terror por acidente nessa obra” temos claros momentos de tensão que vão crescendo angustiantemente com uma letargia aterradora gerando no leitor um clima de suspense que toma conta de forma horripilante em seu desfecho final que mais causa choque do que medo propriamente dito. No entanto, até o clímax, somos perturbados por coincidências estranhas e situações inquietantes.


Uma narrativa muito bem estruturada que não declara, até seus momentos derradeiros, se realmente se trata de uma possessão demoníaca ou alguma enfermidade ou desvio psicológico. Blatty é brilhante ao instigar dúvida no leitor utilizando de elementos críveis como todos os médicos e psiquiatras que tentam, sem sucesso, tratar a pequena Regan. Para deixar tudo bem amarrado o autor abusa de termos técnicos da psiquiatria e teorias discutidas em boa parte da obra.
Alguns leitores podem acabar se irritando com toda uma a construção dos médicos examinando e apesar da clara competência que os personagens parecem ter, não conseguem resolver muito e passando para outra teoria só para ser mais uma vez quebrada pelos exames submetidos à inocente Regan. Mas essa narrativa é totalmente compatível com o ateísmo de Chris MacNeil e com a descrença da era moderna que o autor tanto critica tornando a história mais plausível.
Entretanto, ao mesmo tempo que temos um ceticismo presente, principalmente na mãe de Reagan, temos vários elementos narrativos no mínimo medonhos acontecendo na casa reforçados paralelamente por profanações acontecidas em uma igreja próxima bem como a presença quase reveladora de uma médium Mary Jo Perrin que, em pouco que aparece, tem falas que aumentam ainda mais a tensão da história.


Essa forma que a tensão vai preenchendo a narrativa nos dá a impressão que cada vez mais alguma entidade está, aos poucos, dominando a garota e ganhando cada vez mais força. Tudo isso descrito com bastante calma pelo autor, mas sem perder em momento algum a expectativa do leitor que fica totalmente preso às páginas e acontecimentos habilmente narrados.
William Peter Blatty usa do mais refinado de sua escrita em O Exorcista construindo um enredo sólido e conseguindo caminhar no limiar do real cético e do horror sobrenatural, sem entregar levianamente seu inexorável final. A habilidade que ele dispõe os elementos narrativos é impressionante dando uma sensação única no leitor que sente medo, estranheza, emoção e até nojo na hora certa devido a ótima capacidade de descrição de cenas pelo autor.
O final tem alguns dos diálogos mais perturbadores que já li colocando definitivamente essa obra como gênero de terror com momentos até escabrosos, mas principalmente com um apelo psicológico sombrio e inteligente que nos faz temer por todos os personagens envolvidos, não apenas pela inocente Regan.
O autor trabalha com esses personagens e enredo para nos mostrar como estamos distante da fé e da moralidade cristã ignorando a espiritualidade de Deus e a existência real do mal encarnado representado pelo demônio. Assim Blatty constrói o enredo de forma a corroborar com sua proposta de forma cativante e que faz uma profunda reflexão do quanto os valores da modernidade podem estar perdidamente deturpados e o quanto isso afeta intimamente a humanidade.



Finalmente O Exorcista é recomendado para todos aqueles que gostam de terror e suspense sendo uma obra prima do gênero. Uma narrativa aterradora que é muito imitada por autores posteriores, mas muito raramente trabalhada com tanta genialidade como por William Peter Blatty.


Essa resenha faz parte do projeto #DesafioLiteratureSe2019 do mês de janeiro com o tema "Uma história muito conhecida, mas nem tanto pelo livro" da booktuber Mell Ferraz.
Veja a baixo o vídeo em que ela expõe o desafio...


sábado, 16 de fevereiro de 2019

Conan, O Bárbaro retorna à Marvel Comics


Finalmente, depois de décadas, Conan retorna a sua editora de origem oficial nos quadrinhos, a Marvel Comics. Feito com muito alarde e propaganda, essa pode ser marcada como uma nova era ao personagem revitalizando seu universo e, como muitos fâs esperam, talvez traga seu retorno em várias mídias como o cinema.
Algumas vezes, determinados acontecimentos parecem vir em uma espécie de onda nos dando a impressão que todo um universo está conspirando para que aquilo realmente aconteça. Bem, estamos em uma onda de retorno às histórias de “Espada e Feitiçaria” bem como Conan à frente desse movimento.
Temos lançamentos do personagem por editoras de quadrinhos na Europa e até no Brasil com tentativas de relançar suas revistas clássicas bem como os contos do próprio autor original, mas primeiramente devemos entender como foi a origem de Conan na literatura, bem como a popularização de um gênero e como todo esse universo foi parar nas histórias em quadrinhos. Assim podemos compreender bem exatamente o que está retornando.
Espada e Feitiçaria foi um gênero literário que fez muito sucesso no inicio do século XX devido à popularidade de suas histórias em revistas pulp com suas capas belissimamente ilustradas por artistas que fizeram carreira como capistas.


Robert E. Howard foi um dos mais famosos e aclamados escritores e criador do bárbaro Conan e do rei Kull de Atlântida, bem como do universo que o cerca, sobretudo a “Era Hiboriana”. Autor recorrente da revista Weird Tales, Howard fez sucesso rápido e suas histórias popularizando, junto com outros nomes como Clark Ashton Smith, Fritz Leiber e Michael Moorcock, o gênero de Espada e Feitiçaria dando até outros frutos como a fantasia. Se existe um Tolkien escrevendo O Senhor dos Anéis, é porque antes existiu um Howard escrevendo Conan.
Todo esse sucesso chamou a atenção de Roy Thomas, que viria a se tornar dos maiores nomes editoriais da Marvel Comics. Thomas estava envolto a uma idéia de adaptar personagens da literatura para os quadrinhos em busca de histórias diferentes do que estavam acostumados a fazer na Casa das Idéias.


Foi com muita dificuldade que Thomas se juntou ao artista Barry Wilson Smith lançam Conan The Barbarian em 1970. A idéia original era para chamar o aclamado quadrinista John Buscema, mas não foi possível devido ao seu alto custo, no entanto, isso seria corrigido mais tarde com o lançamento posterior da The savage Sword of Conan. A revista teve um inicio com muito sucesso e a Marvel Comics iria repetir a formula adaptando outras obras e produções também de sucesso como a franquia Star Wars por exemplo.
Entretanto, a editora não consegue mais lidar bem com o personagem Conan e suas histórias nos anos 90 que acaba refletindo nas vendas e o cancelamento das duas revistas. O cimério acaba indo para outra editora, a Dark Horse que também tem um inicio auspicioso, mas logo acaba tendo baixas de vendas. Assim recentemente a Casa das Idéias conseguiu os direitos do personagem novamente, podendo relançar a revista Conan The Barbarian pelo selo Marvel Comics.
O quadrinista Jason Aaron é chamado para fazer esse roteiro de retorno e o artista Mahmud Asrar fica a cargo das ilustrações. Muitos duvidaram do desenhista, mas Asrar surpreende um traço competente para retratar Era Hiboriana embora, claro, pode ter rejeição dos mais saudosistas aos desenhos clássicos de Barry Wilson Smith ou principalmente do aclamado quadrinista John Buscema.


Talvez seja importante destacar que a maioria dos leitores tem uma arte em preto e branco como referencia as estórias de Conan, mas esta abordagem era principalmente usada na Espada Selvagem de Conan com um formato diferenciado dirigido mais ao público adulto. Conan, O Bárbaro era, digamos, um quadrinho mais ao estilo da Marvel Comics e essencialmente colorido.
A Casa das Idéias chega nessa retomada com uma abordagem padrão da fase “Legado” de suas publicações. Embora tenha o número 1 na capa, temos em menor destaque o número 276 que seria referente à continuação do título clássico, sendo uma decisão editorial que é transmitida também na estória, pois logo nas primeiras páginas temos homenagens aos artistas anteriores do personagem mostrando que tudo que ocorreu antes (pela Marvel) deve ser considerada no enredo daqui para frente.


Jason Aaron é um fã confesso de Conan tendo totais condições para escrever uma revista do cimério, não apenas como conhecedor do personagem, mas como ótimo roteirista, principalmente em personagens de estilo mais rústico ou até mitológico, como podemos acompanhar na sua elogiada fase com outro personagem da editora, Thor o Deus do Trovão.
Provavelmente foram suas estórias para o Filho de Odin que influenciaram a Marvel Comics à chamá-lo para a tarefa. Todo o tom mitológico, e até profético, que Aaron usou em Thor o torna uma promessa para escrever Espada e Feitiçaria.
Assim o roteirista tem um inicio bastante promissor usando linhas temporais como fez em Thor, o que dividiu muitos leitores, mas combina incrivelmente bem com a narrativa de Howard que não tinha linearidade temporal ao escrever seus contos sobre o bárbaro da Ciméria. Aaron convoca o Rei Conan logo no inicio (referencia tríplice aos contos, histórias em quadrinhos, mas principalmente ao filme de mesmo nome estrelado por Arnold Schwarzenegger em 1982), mas paralelamente também mostra o personagem mais jovem ao que tudo indica enfrentando a mesma ameaça em duas linhas temporais em um título de arco aterrador de A Vida e Morte de Conan.


O retorno de Conan, O Bárbaro para a Marvel Comics ainda não pode ser avaliado totalmente na leitura de apenas sua primeira revista, mas que teve um trabalho muito competente até aqui e que os quadrinistas tem total capacidade de produzir material digno do Rei da Aquilônia, temos certeza disso! Entretanto nos resta aguardar como o personagem vai se desenrolar pela Casa Das Idéias daqui para frente.

Em resenhas posteriores pretendo tratar arco por arco concluído dessa nova fase do Cimério na Marvel Comics e também fazer alguns comentários sobre A Espada Selvagem de Conan que já estreou agora em fevereiro pela mesma editora.