quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

O Renascimento do Universo DC Comics


Agora com mais de dois anos depois e culminando em seu final, já está mais que na hora de analisar toda a fase do DC Renascimento, tanto em sua estória como na repercussão para compreender se essencialmente esse período de publicações da editora realmente cumpriu a proposta e se essa estratégia funcionou refletindo nas vendas. 
O DC Renascimento foi uma iniciativa da editora em frente à baixa de vendas que estava sofrendo com a estratégia anterior, o chamado Novos 52. Nessa antiga fase, na tentativa de atualizar seus super heróis, a editora muda não só o ritmo das estórias, alterando as equipes criativas, mas acaba exagerando nas novas definições modificando a essência de seus personagens. O resultado é que os antigos leitores ficaram muito insatisfeitos com o fato que não mais reconheciam os seus heróis que cresceram amando e os novos não acharam as estórias tão boas para continuarem lendo.
Os Novos 52 foram um fracasso de publico e vendas, logo o DC Renascimento viria para arrumar a casa literalmente.
Para deixar bem claro a estratégia da editora é lançada a revista em oneshot, ou seja de uma única edição, chamado Universo DC Renascimento que, unido a uma ótima campanha publicitária, mostra aos leitores para o que veio indicando enredos que serão trabalhados até o final da fase. Com uma narrativa emocionante de Geoff Johns que respeita todo o legado da editora, mas principalmente seus leitores, o quadrinho foi um sucesso tremendo emocionando os leitores antigos e empolgando os novos para ler toda a fase interessados no que viria pela frente.


Assim a primeira análise que podemos fazer do período é que a iniciativa Dc Renascimento cumpriu o que havia se proposto a fazer, ou seja, que os heróis voltassem as suas personalidades aclamadas e tivesses suas identidades novamente reconhecidas pelos leitores que há muito os acompanhavam. Ainda trouxe leitores novos devido à enorme campanha publicitária e a boa qualidade das estórias. Tudo isso sem alterar a cronologia não caindo na estratégia batida de mais um reboot, que tantos sempre reclamavam que acontecia muito no universo das histórias em quadrinhos.
A campanha publicitária acertada e a qualidade das estórias são peças fundamentais, e pouco analisadas, do sucesso da iniciativa. Comparando com sua rival, a Marvel Comics, que praticamente na mesma época colocou em prática sua nova iniciativa chamada Totalmente Diferente Marvel, não tivemos no DC Renascimento algo da qualidade da revista Visão do Tom King, mas também não tivemos uma enxurrada de tantos títulos sofríveis também, como acabou sendo feito pela editora concorrente. O resultado disso refletiu nas vendas que inverteu o quadro colocando a DC Comics à frente em praticamente todo esse período.
A qualidade dos títulos do DC Renascimento se mostraram bons, em uma maioria quase absoluta, tendo poucos títulos ruins que mesmo assim não são um total desastre. Logo devemos fazer aqui um apanhado das principais revistas mostrando suas características em linhas gerais para podermos analisar esse período com um maior senso de criticidade. Posteriormente poderemos analisar mais profundamente os títulos da editora, incluindo s não comentados aqui, para compreender melhor qual exatamente foram os pontos de acertos da iniciativa.


Os títulos que envolvem o Super Homem, e seus personagens relacionados, foram o que mais tiveram que sofrer mudanças e acertadamente a editora não teve medo de fazer tais alterações radicais. Para trazer o personagem de volta aos eixos devíamos buscar do passado toda aquela mística heróica messiânica que envolvia o herói e para isso a DC Comics trouxe de volta o aclamado Dan Jurgens, que já havia trabalhado com o personagem em uma de suas melhores fases, para assumir o título Action Comics com a missão de trazer de volta o Super Homem clássico de ideais elevados enquanto Peter J. Tomasi ficaria com o título Superman trabalhando a relação do herói com sua família, a esposa Lois Lane e o filho Jonathan Kent.
Ambos os títulos são da melhor qualidade tendo a Action Comics um sucesso de critica absurda em estórias de muita ação (fazendo jus ao título do quadrinho) e com toda aquela atmosfera heróica do bem contra o mal exaltando o bom mocismo do Super Homem como Jurgens já tinha feito entre os anos 80 e 90. No entanto, apesar de não ter sido recebida com tanto alarde, acredito que o trabalho de Tomasi a frente do título Superman tenha sido no mínimo de igual qualidade, pois ao invés de apelar a estórias mirabolantes e vilões poderosos e caricatos, temos uma trama muito mais intimista, desde o primeiro arco da revista, que mexe muito com o psicológico do Super Homem e faz uma trama mais pessoal e profunda que apenas um quadrinho de pura ação não trabalharia. Ao acompanhar um Super que além de lidar com um mundo que não é dele, tem que ajudar sua família a fazer o mesmo, além de criar um filho que, quer se tornar um herói como o pai, mas não controla os poderes instáveis que possui.  


Já nos títulos do Batman (e da chamada “bat-família”) temos ainda mais qualidade em roteiro e desenho. O histórico título Detective Comics inicia com os roteiros de James Tynion IV que cria uma estória intrigante fazendo o Homem Morcego criar uma equipe para resolver assuntos que ele mesmo não pode resolver passando a liderança para a Batwoman; que é trabalhada nesse título tão bem quanto em sua própria revista, e as relações entre os personagens do improvável grupo são ótimas como todo o enredo dessa fase da revista. 
O título Batman fica por conta do agora famoso (ou infame por alguns) Tom King, que trás um Homem Morcego essencialmente humano, mas com toda a inteligência e genialidade característica do personagem. Tendo a estória dividida em arcos e ciclos bem planejados podemos acompanhar que o extraordinário do Batman é justamente o heroísmo máximo de que alguém sem poderem pode fazer mesmo em um universo de uma profusão de meta humanos. Temos um forte tom investigativo e uma ótima exploração dos vilões como se exige nas revistas do herói. Talvez esse seja o melhor título mensal de toda a fase do DC Renascimento.


A Mulher Maravilha já tem um tratamento todo diferenciado nessa fase comandada por Greg Rucka, que tem a brilhante idéia de dividir as estórias iniciais da personagem em dois arcos tendo um reestruturando o passado da personagem. Para isso ele intercala as edições e os desenhistas para dar uma identidade visual a cada estória, passado e presente. Temos a incrível Nicola Scott  e Romulo Fajardo Jr. na arte de “Ano Um” e Lian Sharp e Laura Martin na arte de “Mentiras”.
Esses primeiros arcos do título da Princesa de Themyscira são empolgantes tanto em roteiro como visualmente e sua alternância e a ligação entre as duas estórias é um show a parte, arquitetado pelo competente argumentista.  Assim somos levados a imaginar o quanto será fenomenal essa fase da personagem, pois a editora teve todo um cuidado em fazer um trabalho competente, principalmente devido ao sucesso do filme Mulher Maravilha, mas infelizmente as estórias perdem um pouco a qualidade com o tempo o que pode decepcionar alguns. No entanto, continuam sendo ótimas estórias com tramas interessantes de se acompanhar.


O título Flash parece iniciar com uma premissa simplória e até infantil, pois na estória gira entorno de uma tempestade que acaba proporcionando o dom da força de aceleração a quase toda a população de Central City. No entanto, o roterista Joshua Willianson soube trabalhar brilhantemente essa premissa escrevendo um quadrinho envolvente e muito divertido. A arte de Carmine di Giandomenico só reforçam o estilo e atmosfera suave que a história em quadrinhos quer proporcionar.
A qualidade da revista só melhora com as edições até chegar ao bem executado arco “O Bótom” ao lado do título do Batman, que, apesar de não ter revelado todo o mistério, deixa um ótimo enredo para a saga final do “Relógio do Juízo Final”. Logo, Flash é um dos títulos mais importantes dessa nova iniciativa e por isso muito bem executado pela DC Comics.


Aquaman chega as mãos de Dan Abnett com a inglória tarefa de superar a elogiada fase dos Novos 52 (diferente da maioria dos títulos) trazendo um dos mais antiquados e ridicularizados personagens da DC Comics para os holofotes, talvez devido a sua participação nos filmes da produtora Warner Bros. O argumentista acerta muito em não querer relacionar Arthur Curry com sua contraparte interpretada pelo ator Jason Momoa, mas acaba entregando uma narrativa não tão boa quanto o aclamado arco “O Trono de Atlantida” do próprio Geoff Johns. 
Entretanto, temos uma estória muito bem executada no arco inicial “O Afogamento” tendo altos e baixos nas estórias seguintes do personagem. Abnnet é muito acertado em mostrar um Aquaman tendo que superar as desconfianças e indiferenças que sofre tanto dos povos aquáticos como dos da superfície. Trabalha bem não apenas as questões psicológicas do herói, mas também as políticas chegando a fazer ótimas criticas ao governo estadunidense e a forma que se relacionam com os estrangeiros. Uma narrativa que trabalha bem o passado, não caindo sempre na facilidade do recurso intensivo de flashback, que aqui são pontuais e bem colocados.


O universo do Lanterna Verde aparece em dois títulos; o Lanternas Verdes do argumentista Sam Humphries que mostra as estórias de Simon Baz e Jessica Cruz onde, ambos, foram indicados como protetores da Terra; e a revista Hal Jordan e a Tropa dos Lanternas Verdes roterisada por Robert Verditti voltada mais a estórias espaciais focada no Lanterna Jordan. Talvez esteja aqui minha maior surpresa (juntamente com Esquadrão Suicida) em toda essa fase do DC Renascimento, pois ambos os quadrinhos tem uma qualidade bem acima da média me fazendo ter simpatia por personagens novos ou que nunca tinha gostado muito.
São estórias envolventes que sabem utilizar muito bem o universo dos Lanternas respeitando e ao mesmo tempo inserindo elementos novos de maneira as vezes arriscada, mas quase sempre muito acertada. Os arcos vão ficando cada vez mais interessantes com dozes de piada e ação na medida certa. O desenvolvimento de Baz e principalmente da Cruz são incríveis e raramente podemos ver Hal Jordan tão bem representado como um herói de ideais elevados unido a uma experiência que fazem toda a diferença na estória.


Falando das equipes temos  Liga da Justiça que talvez seja minha única decepção em uma iniciativa tão boa como o DC Renascimento. Bryan Hitch não consegue roterizar estórias empolgantes como deveria, talvez preso a responsabilidade de escrever enredos grandiosos e apocalípticos. Não consegue desenvolver bem a relação dos personagens, embora saiba trabalhar cada personalidade de forma convincente. Apesar disso o quadrinista tem uma narrativa relativamente coesa e que melhora um pouco com o tempo.
Christopher Priest assume o título na edição 17 (ou 34 nos EUA) trazendo o arco “O Povo Contra a Liga da Justiça” onde o argumentista trabalha a relação das pessoas comuns com a Liga depois de alguns eventos problemáticos. Priest tem uma narrativa mais convincente elevando bem a qualidade do quadrinho acertando praticamente todos os problemas de seu antecessor para poder entregar a entregar a revista ao quadrinista Scott Snyder posteriormente.  


Outra grande surpresa, positivamente, do DC Renascimento para mim foi a revista Esquadrão Suicida, principalmente depois de um filme que não agradou todos os fãs das histórias em quadrinhos. Como acontece com o Lanterna Verde eu nunca apreciei muito esses personagens, mas Rob Willians, juntamente com o ótimo artista Ivan Reis, soube trabalhar os anti-heróis de maneira bem mais crível que sua contraparte cinematográfica trazendo estórias com ótimo ritmo e idéias excelentes.
Rapidamente surge dessas duas equipes a primeira grande saga do DC Renascimento chamada Liga da Justiça VS Esquadrão Suicida comandada pelo roterista Josha Willianson que poderia ser bem melhor trabalhada, mas entrega satisfatoriamente bem o embate entre esses grupos onde já havia tido mostrado tensões entre os personagens principalmente pelo Batman. A editora decide aqui trabalhar com cautela ao invés de promover uma mega saga mirabolante entregando uma boa estória com repercussões comedidas para não se arriscar muito.


Tendo o risco de me alongar demais, quero destacar alguns títulos como o Arqueiro Verde. Havia muita promessa para esta fase do Arqueiro escrita por Benjamin Percy, pois a maioria dos leitores esperavam algo bem diferente do esquecível período do personagem nos Novos 52, ou melhor, uma parte dessa fase e sua torpe aproximação com a série de TV. Logo, a expectativa era a volta do velho Arqueiro, um Herói da Justiça Social, ao estilo do arco de estórias com o Lanterna Verde nos anos 70 comandado pelo Denis O’Neil e Neal Adams. No entanto, talvez seja justamente por isso que o quadrinho do DC Renascimento não atente a tão alta expectativa.
A estória é ótima, mas muito pouco desenvolvida e quando você acha que teremos mais profundidade; (como quando a Canário Negro mostra toda a hipocrisia de um herói que diz defender os desvalidos e necessitados, mas é um dos homens mais ricos do mundo); o argumento não atinge a reflexão necessária e, torna uma estória de ótimas idéias, bem superficial. Os desenhos de Otto Schimidt pioram as coisas por, apesar de bem executados, tem um estilo todo “teen” de desenhos animados que não combina com a estória sombria desenvolvida por Percy, melhorando levemente quando Juan Ferreira assume a arte. Resumindo, Arqueiro Verde tem ótimas idéias e sombrias como o personagem pede, mas não tem o desenvolvimento que certamente merecia.


Quero destacar também o título Exterminador que sempre foi um daqueles vilões de tanto os leitores gostarem acabou tendo suas motivações e carismas tão desenvolvidos até virar um anti-herói. Confesso que nunca gostei do personagem nos quadrinhos preferindo até sua adaptação em outras mídias como vídeo games e séries de TV. No entanto, fiquei muito satisfeito com a história em quadrinhos do Exterminador no DC Renascimento!
O argumentista Christopher Priest faz uma estória de espionagem brincando com os clichês do gênero e por vezes pervertendo muitas soluções fáceis geralmente encontradas em quadrinhos de super heróis. Logo temos uma estória bem executada de muitas reviravoltas e que ainda tem tempo para desenvolver mais o personagem deixando o Exterminador mais dentro dos tons cinzentos entre o bem e o mal criando uma identificação ainda maior pelo personagem onde com certeza ele não é um herói, mas você torce por ele mesmo assim.


Por último quero também me dedicar ao Asa Noturna, pois havia uma maior empolgação da minha parte por ler seu título, devido a ótima dele na fase dos Novos 52, principalmente quando Tom King assume o personagem. Assim Tim Seeley parte daí com um Dick Grayson que foi dado como morto e tenta voltar a ser o Asa Noturna enquanto se infiltra no, agora, Parlamento das Corujas. Seeley trás ainda mais humanidade ao personagem que quer destruir uma organização criminosa global por dentro e ainda assim não se corromper ou literalmente cruzar a linha que separa heróis de vilões.
O autor se utiliza ainda os novos vilões do Batman, a Corte das Corujas e avança ainda mais sua mitologia tornando-a bem maior que anteriormente. Fiquei bem satisfeito com o primeiro arco chamado “Melhor que o Batman”, mas senti falta de mais detalhes sobre o Parlamento das Corujas e mais informações sobre seus agentes, os garras, algo que eu também tinha sentido quando Scott Snyder os criou.


Resumindo a DC Renascimento foi uma excelente iniciativa da editora que acertou muito ao ouvir seus fãs e entregar exatamente o que eles estavam pedindo. A qualidade das estórias se mantêm em um bom nível, mesmo as que não desenvolveram tão bem e infelizmente talvez a única exceção seja mesmo o título da Arlequina que teve os roteiros, escritos pela dupla Amanda Conner e Jimmy Palminotti, sofríveis o suficiente para me fazer abandonar a revista. No mais, temos títulos muito bem trabalhados e que principalmente soube respeitar seus fãs antigos e ainda atraindo novos leitores para a editora se consolidando à frente da concorrente tanto em crítica quando em vendas. Uma estratégia de marketing muito bem empregada e com uma ótima base em ter ótimos profissionais criando de forma competente e produzindo um resultado muito bem executado. 

2 comentários:

  1. Ótima análise,realmente a DC com o renascimento trouxe um fôlego que apesar de revigorado respeita seus leitores antigos ,parabéns ótima matéria.

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    1. Exatamente! A DC Comics conseguiu assim atraindo novos leitores sem perder os antigos!

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