sexta-feira, 9 de abril de 2021

Doutor Estranho: O Juramento


Minissérie escrita por Brian K. Vaughan e desenhada por Marcos Martín que, lançada pela Marvel Comics em 2006, acompanha o Doutor Estranho em um dilema para salvar a vida de seu fiel amigo Wong de um tumor cerebral ao mesmo tempo que o auto proclamado Mestre das Artes Místicas será desafiado por fantasmas do seu passado em uma jornada que o levará à várias dimensões na busca e proteção de uma mágica poção que pode mudar o destino da humanidade.  Tal investigação não apenas levará o Mago Supremo aos confins da realidade, mas também aos cantos mais escuros de sua própria alma guiado apenas pelo seu juramento mais antigo... o que fez como médico.  

Marcos Martín é um desenhista de arte sequenciada espanhol que inicialmente chamou atenção quando substituiu Javier Pulido na minissérie Robin Ano Um da DC Comics tendo trabalhado posteriormente no título Batgirl Ano Um da mesma editora. Fundou, junto com o amigo a Panel Sindycate, uma editora de webcomics produzindo a aclamada série The Private Eye, que chegou a ganhar o prêmio Eisner em 2015. Martín já tinha recebido o prêmio em 2012 por Demolidor junto a Mark Waid e Paolo Rivera por melhor série continuada e também indicado como melhor artista e melhor capista no mesmo trabalho.  



Aqui sua arte é precisa e bem executada ao estilo um tanto quanto bem definido como de costume para quadrinhos de super heróis, mas tendo algumas passagens de quadros mais dinâmicas, embora longe das vertiginosas como era esperado para um enredo com o Doutor Estranho. Provavelmente foi uma escolha deliberada para homenagear as artes mais clássicas do personagem e acompanhar um roteiro investigativo mais linear com reviravoltas apoiadas a desenhos impactantes e expressões bem marcadas dos personagens. 

Brian K. Vaughan é um escritor de histórias em quadrinhos e roteirista de televisão estadunidense muito aclamado pela renomada série do selo Vertigo chamada Y O Último Homem, mas também reconhecido como criador de Os Fugitivos para a Marvel ComicsEx Machina para a editora WildstormPaper Girls e Saga para a Image Comics e Os Leões de Bagdá da mesma Vertigo. Teve breves passagens por vários títulos como Batman, Homem Aranha, Mulher Maravilha, Lanterna Verde, Monstro do Pântano, X-Men e Liga da Justiça. Chegou a ganhar e ser indicado à vários prêmios Eisner Award. Foi roteirista de alguns episódios da famosa série televisiva Lost e da primeira temporada de Under the Dome, adaptada do livro de Stephen King, sendo também seu produtor executivo.  

O roteiro é muito fluido e bem executado com um enredo de investigação paranormal que vai se revelando em um ritmo ótimo à medida que mantem o interesse na trama página a página. Os diálogos são dinâmicos e levemente expositivos, pois usam a Enfermeira da Noite como alguém de fora do “universo mágico” para que se tenha alguns pontos sendo explicados, mas isso não atrapalha a estória, pois muito do que está acontecendo é desconhecido pelo próprio protagonista sendo muita coisa mostrada e não contada.   



Ambos quadrinistas chegam a essa estória do Doutor Estranho com a rara oportunidade de redefinir um dos mais importantes personagens da editora, mas ao mesmo tempo fora dos costumeiros holofotes dos super heróis, pois o Mago Supremo era muito importante dentro do Universo Marvel, mas não era um de seus campeões de vendas a décadas.  

Logo a primeira ideia era entender os motivos que levavam o personagem a não ser tão querido pelos leitores, adaptando-o aos dias mais atuais ao mesmo tempo que fariam um resgate à sua essência criada nas páginas de Strange Tales número 110 em julho de 1963 por Stan Lee e Steve Ditko. Esse “renascimento” foi buscado tanto pelo roteirista como pelo desenhista que ao mesmo tempo que buscava emular os traços antigos do Mago Supremo, como sua semelhança ao ator Vincent Price (inspiração original), mas também adotava passadas mais dinâmicas e modernas na arte e nas próprias expressões do personagem.  

Os autores voltariam a retrata-lo como alguém que veio da medicina, pois quase sempre o protagonista era visto apenas como místico, trazendo o seu passado fazendo-o novamente importante em suas estórias bem como o juramento de Hipócrates (que dá nome a minissérie). Tal juramento seria o primeiro que o Doutor Estranho teve que fazer e, seu não cumprimento está intimamente ligado ao seu acidente, junto a perda da capacidade de controlar os movimentos precisos com as mãos e, como consequente, sua ruína como médico cirurgião.  

Tudo é muito bem explorado nessa estória que, apesar de recontar sua origem, isso é feito de maneira nada enfadonha e muito bem amarrada com a trama principal. Temos um enfoque na personalidade arrogante do protagonista que, mesmo tendo aprendido sua lição se consagrando um super herói agora, continua com tais desvios de personalidade apesar de ser sempre compelido a ajudar ao próximo buscando o cumprimento do juramento, diferente do que o motivava no passado.   



Assim o enredo joga com o personagem colocando pessoas que ama em sério risco de vida, aliás ele próprio não escapa desses mesmos riscos, dando ao atual Doutor Estranho todo o carisma necessário, apesar da arrogância superficial, para que o leitor se identifique com ele e sua árdua jornada.  

Nada aqui de poderes mirabolantes e algum apocalipse místico em iminência, temos uma demanda mais intimista e por isso mesmo mais dolorosa. Não é uma estória que trata de dimensões estranhas, poderes paranormais bizarros ou criaturas grotescas, mas o interior de alma de um homem machucado pelos erros do seu passado que ainda não foram totalmente curados, mas que caminha em um esforço genuíno de não os repetir mais. 

O Juramento é uma história em quadrinhos impar entre as revistas que existem do Mago Supremo dando ao personagem toda a profundidade e carga dramática à altura de sua importância no Universo Marvel, ao mesmo tempo que o faz renascer aos leitores o interessa em que possam se identificar com sua estória apesar de todo hermetismo que acompanha o protagonista. Os autores tornam Doutor Estranho um personagem mais acessível por de trás de toda aquela máscara arrogante e pedante de Mestre das Artes Místicas, mostrando também um homem falho e machucado que tenta tornar o mundo ainda melhor mesmo que tenha que enfrentar obstáculos muito maiores que suas capacidades, fazendo-o não apenas chegar aos limites da realidade, mas também aos seus próprios limites físicos, mentais e até morais.  

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