segunda-feira, 28 de junho de 2021

The Walking Dead: Caminhos Percorridos


Segundo arco (e encadernado) da história em quadrinhos elaborada e escrita por Robert Kirkman com desenhos de Charles "Charlie" Adlard e arte final de Cliff Rathburn, publicado pela editora Image Comics. Temos uma continuação direta do volume anterior em que acompanhamos o drama do Rick Grimes liderando a saída dos sobreviventes do acampamento em busca de um novo abrigo. Para piorar, além da dificuldade de achar um local ideal, temos o inverno que agrava ainda mais a situação dos personagens em total desespero, marcados pela fome e a presença sempre constante dos mortos vivos. 

Se você quiser saber mais sobre como The Walking Dead foi criado nos quadrinhos, sobre seu idealizador e suas inspirações; aproveite para ler também nossa resenha anterior sobre a obra. Também é possível acompanhar nossa análise do volume anterior chamado Dias Passados. No entanto, se quiser saber mais sobre este segundo encadernado continue lendo por aqui. 



Em Caminhos Percorridos temos uma mudança na equipe artística da publicação em que Tony Moore não mais faz os desenhos. Agora as ilustrações ficam por conta de Charlie Adlard um quadrinista britânico que iniciou sua carreira na Inglaterra em revistas como 2000AD e Judge Dredd. Nos Estados Unidos ficou famoso por sua participação em trabalhos como Arquivo X pela Topps; Clube do Inferno e Warlock pela Marvel Comics; e Batman: Gotham Knights e Lanterna Verde/Arqueiro Verde pela DC Comics. Sua arte evoluiu e se adaptou a proposta de cada trabalho, mas se especializou em algumas técnicas narrativas da nona arte como o uso de splash pages ou “páginas de impacto” e, no caso particular de Walking Dead, tem um domínio perfeito de luz e sombra com os tons cinzas das incríveis artes finais de Cliff Rathburn fazendo desta uma ótima parceria 

Claro que a mudança nos desenhos causa certo estranhamento no início, principalmente para os leitores que já vinham da série televisiva e tinham como outra a identidade visual dos personagens. Uma nova redefinição pode dificultar um pouco, mas como a participação de cada personagem é sempre marcante em toda a publicação esse novo aspecto visual é superado rapidamente neste próprio volume e, sem maiores dificuldades, ficamos mais confortáveis aos novos desenhos. 

Entretanto é inevitável surgir comparações com o artista anterior, pois à primeira vista os novos quadrinistas não parecem ser tão detalhistas, principalmente com cenários, como seu antecessor. No entanto, essa é uma crítica rasa e pouco refletida sobre a obra. Temos sim um “desaparecimento” do ambiente como pano de fundo, mas isto se deve ao fato que Adlard se foca muito mais nas excreções dos personagens, o que para o roteiro de Kirkman funciona perfeitamente. Temos agora mais um recurso narrativo em prol dos dramas pessoais elaborados na publicação bem como mais espaço para a importância que os autores dão a cada personagem, individualizando-os e os tornando tão reconhecíveis como o próprio protagonista Rick Grimes, mesmos os recém chegados.  



Quando o cenário é importante na narrativa, Adlard e Rathburn faz questão de produzir quadros impactantes em plano aberto ricos em perspectiva e detalhes sublimes dando uma verossimilhança maior em um universo de apocalipse zumbi. Assim sendo, os artistas sabem muito bem dosar o foco visual inclusive as passagens entre quadros dando ritmo desejado ao mesmo que continuam mostrando toda a degradação do mundo que rodeia a estória.  

Aqui temos uma leve ampliação do universo estabelecido por Robert Kirkman enquanto acompanhamos a busca dos protagonistas por um local seguro. Uma busca obviamente árdua que os leva a desventuras por todo encadernado, tudo muito bem planejado para o final catártico da última edição desse volume. Temos aqui já a quebra de expectativas que irá nos acompanhar por toda a publicação sendo um dos fatores que fez The Walking Dead ser tão aclamada.   

Também temos um início, quase germinal, de outro tema crucial desse título que se explica nas próprias falas do autor como “o perigo real de um apocalipse zumbi não são os mortos e sim... os vivos”. Assim já temos nesse Caminhos Percorridos um vislumbre de como os vivos podem ser complexos levando a situações de tensão e grande risco. Os dilemas morais continuam e apenas se ampliam com a chegada de novos e marcantes personagens que trazem consigo problemáticas bem reais e, até cotidianas. Percebemos que mesmo em situações extremas tais complicações ainda perduram e agora são ampliadas ou combinadas com traumas gerados especificamente em um pós apocalipse. 



Muitos desses traumas que permeiam esse arco podem ser resumidos, principalmente, com a ainda não aceitação da perda. Aliás esse tema nos parece recorrente em The Walking Dead desde a primeira edição, mas aqui se torna ainda mais inexorável. Parece que, apesar da publicação não ter mostrado ainda seu início pandêmico, temos cada vez mais sinais de que o mundo nunca voltará a ser como antes e sua desgraça se torna, aos poucos, mais evidente. É como se os leitores fossem sufocados vagarosamente como se a corda que laça seus pescoços fossem lentamente apertando cada vez mais, à medida que vai sendo revelado aos personagens o quanto o mundo foi impactado pelo apocalipse zumbi.  

Um recurso narrativo de terror muito eficiente que vai gerando cada vez mais tensão no leitor à medida que o enredo avança. Isso é crucial para estórias que se propõem a ser muito longas, como é o caso aqui, sem que fiquem repetitivas ou maçantes com o tempo e Robert Kirkman teve uma grande habilidade em manter o ritmo nessa publicação bem diferente do que acontece com a série televisiva.  Nos quadrinhos temos um alto nível de enredo e trama que permanece durante todas as edições e já podemos perceber pinceladas disso neste mesmo volume.  

O roteiro parece ser muito simples e que não progride muito com o enredo à primeira vista, mas seu dinamismo faz com que seja instigante a cada página, ou edição, fazendo o leitor ficar preso a trama, não sentido o arco evoluir causando aquela ótima sensação de querer ler o próximo volume assim que este chega em seu derradeiro final. Claro que as reviravoltas contribuem muito para isso, principalmente a do final desde encadernado, mas The Walking Dead vai um pouco além, nos deixando entretidos a cada quadro disposto em uma ótima arte sequenciada e muito bem executada narrativamente.  

Ainda o melhor desta estória se faz no roteiro com diálogos sempre precisos que podem parecer superficiais à primeira vista, mas rapidamente ganham importância narrativa quando a trama avança e muitos acontecimentos são revelados e digeridos pelos protagonistas (e consequentemente os leitores).  



The Walking Dead continua sendo uma das melhores publicações produzidas no meio mainstream nos últimos anos e uma ótima leitura para qualquer perfil de consumidor mesmo de fora do universo das histórias em quadrinhos.  


Leia também a resenha do próximo volume... 

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